Nesta segunda-feira, 12 de maio, o ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal, STF, reabriu os trabalhos da mesa de conciliação sobre a demarcação de terras indígenas e a lei que inconstitucionalmente instituiu o marco temporal. Na reunião, Mendes criticou “bolhas ideológicas” de políticos e ONG´s, pedindo boa-fé e interesse na conciliação, pois sem um consenso, a violência por terras continuará no Brasil. O ministro ainda explicou que o conflito no campo é “algo lucrativo para organizações sem fins lucrativos e parlamentares”, que se promovem com as disputas. Reafirmando que o STF é o melhor lugar para o diálogo sobre terras indígenas, Gilmar Mendes disse que, se o Supremo não tomar uma decisão, o Congresso vai decidir no lugar, defendendo assim o anteprojeto feito por seu gabinete. Com isso, ele quis mostrar que uma solução acordada no STF permite mais participação das comunidades indígenas e dos outros envolvidos no assunto. Até o momento, 20 audiências públicas sobre a demarcação de terras foram feitas e esta já é a terceira prorrogação da mesa de conciliação. A próxima audiência está prevista para o dia 19 de maio e os trabalhos da comissão se encerram em 25 de junho
Mesmo com essas falas do ministro Gilmar Mendes, as últimas decisões do Supremo Tribunal Federal causaram a angústia dos povos indígenas de todo o país. Na reunião do dia 17 de fevereiro, a deputada federal Célia Xakriabá, publicamente favorável aos povos indígenas, foi impedida de participar da mesa de conciliação no STF sobre a demarcação de terras indígenas e substituída pela deputada Silvia Waiãpi, que não participou de nenhuma reunião anterior sobre o marco temporal. No mesmo dia, a minuta do projeto, elaborado pelo STF, foi apresentada e embora não tenha mencionado explicitamente o marco temporal, apresentou medidas que limitavam demarcações e permitiam a mineração em terras indígenas. O texto indicava que mesmo com a discordância dos povos originários, a mineração nas aldeias seria permitida, desde que os recursos fossem estratégicos economicamente e aprovados pelo Congresso.

Foto: Christian Braga / Greenpeace
Mesmo após os ataques violentos às aldeias e a urgência dessa decisão ter sido destacada pela Organização das Nações Unidas, ONU, ela permanece sendo ignorada pelo STF. A consequência não é algo que pode ser desfeito. São muito mais do que vítimas e nomes riscados de uma lista a favor da violência, são filhos e pais de alguém, são indígenas, pessoas amadas por suas famílias, que perdem a vida para uma guerra cruel, que já poderia ter sido evitada há muito tempo com a definição do STF em 2023, quando por 9×2, já havia enterrado a ideia do marco temporal ao instituir uma jurisprudência favorável aos povos originários.
Durante a retomada dos trabalhos da comissão especial que discute a demarcação de terras indígenas, o ministro do STF Gilmar Mendes disse que é necessário que “todos entendam de uma vez que qualquer decisão judicial do STF não encerrará o conflito, seja pela constitucionalidade da Lei 14.701/2023, seja pela sua inconstitucionalidade, porque invasões, conflitos e mortes no campo continuarão a acontecer em um clima de guerra civil, em pleno século XXI. A guerra só existe porque o diálogo foi insatisfatório ou não foi realizado a contento”, explicou. Ele ainda ressaltou que é preciso “ter interesse e boa-fé” para resolver o problema da demarcação dos territórios, que já dura há anos.

Foto: Sofia Lisboa/ Mídia Ninja
“Espero que vocês usem o diálogo e o entendimento ao invés das lutas tradicionais, que já se mostraram não dar certo porque as mortes e os conflitos no campo permanecem e estão aí acontecendo com bastante frequência, infelizmente”, falou Mendes. Para ele, quem escolhe o caminho do conflito não está defendendo o interesse da sociedade e nem tentando proteger os direitos dos indígenas. Isso porque o confronto acaba impedindo que muitos territórios indígenas sejam oficialmente reconhecidos e ainda aumenta os conflitos no campo.

Foto: Joédson Alves / Agência Brasil
Segundo Gilmar Mendes, “durante o decorrer desta Comissão, temos visto parlamentares defendendo eleitoralmente posições irrefletidas, de forma demagógica, olvidando que estão vendendo ilusões, ao passo que muitas ONGs acabam incentivando invasões e conflitos. Ambos agem irresponsavelmente, porque não podem assegurar a paz no campo, o que acaba sendo um ‘negócio lucrativo’ para tais intermediadores do conflito. Os parlamentares e algumas ONGs se autoafirmam na sua bolha com base em devaneios e prometem o que não podem cumprir: são mercadores de ilusões”.

Comissão para elaborar anteprojeto da Lei do Marco Temporal no congresso foi prorrogada até 25 de junho; na imagem, Gilmar Mendes na reunião desta 2ª feira – Foto: Gustavo Moreno/ STF
O ministro defendeu que o STF é o lugar mais adequado para discutir a questão das terras indígenas. Segundo ele, se o tribunal não chegar a uma decisão, o Congresso acabará fazendo isso, já que existe uma proposta de emenda constitucional para usar o ano de 1988 como marco para a demarcação dessas terras. Por isso, ele acredita que uma solução acordada no STF é melhor, pois permite mais participação das comunidades indígenas e das outras partes envolvidas. Ele também destacou acordos que considera exemplos positivos, como o caso Ñande Ru Marangatu, em que foi mantida a demarcação feita em 2005 e os fazendeiros vão deixar a área em troca de R$ 146 milhões de indenização. Citou ainda a decisão do ministro Flávio Dino que garantiu o pagamento de royalties aos indígenas afetados pela usina de Belo Monte.

Usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará – Foto: Reprodução
A CONAFER por meio da Secretaria Nacional de Povos, Comunidades Tradicionais e Política Social, a SEPOCS, apoia de forma permanente o marco ancestral contra a inconstitucionalidade do marco temporal. Além disso, a SEPOCS segue promovendo ações educativas e cursos sobre direitos indígenas nas aldeias. Nesse cenário de morosidade por uma definição sobre a demarcação de terras indígenas, a atuação da CONAFER se destaca como um exemplo de compromisso com os direitos dos povos originários. Por meio da SEPOCS, a entidade tem exercido um papel fundamental ao apoiar o marco ancestral e promover a conscientização nas comunidades, levando informação, formação e cidadania diretamente às aldeias.