da Redação
Um nova portaria do MAPA entrou em vigor dia 1ª de outubro regulamentando os critérios avaliativos para apicultores e meliponicultores, incentivando a produção e o comércio da produção de espécies nativas. A medida potencializa o valor dos produtos desenvolvidos por pequenos produtores, em todo o território nacional e aumenta a abrangência e alcance do Selo Arte, por meio da portaria 289, oficializada em 14 de setembro último, após consulta pública. Um dos critérios para recebimento do Selo, descrito no artigo 2 da portaria, é que as abelhas nativas precisam ser cultivadas dentro de sua área geográfica natural de ocorrência, o que possibilita que o consumidor adquira um produto naturalmente brasileiro
Veja a portaria nº 289, de 13 de SETEMBRO DE 2021.
Em 2019, segundo o IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a produção foi de 45,9 mil toneladas, volume 10,60% maior que em 2017, porém insuficiente para incluir o Brasil na lista dos 10 maiores do mundo. A produtividade do mel brasileiro ainda é baixa quando comparada a outros países.
Com Paraná e Rio Grande do Sul rivalizando pelo posto de maior produtor, os outros estados se acomodam nas demais posições do ranking do mel. O Piauí é o terceiro, com 5.024 toneladas, seguido por São Paulo (4.527), Minas Gerais (4.227), Santa Catarina (4.081), Bahia (3.942), e Ceará (2.677). 33% dos brasileiros consomem mel diretamente do produtor no intuito de reduzir o risco de comprar mel adulterado. O segundo local de procura de mel é em supermercados (22,7%) e o terceiro em farmácias (13,1%).
“O Brasil é um dos países com maior potencial de produção de mel do mundo. Temos uma enorme biodiversidade de paisagens florísticas e biomas, que dão ao nosso mel vários sabores. O mel nesse ponto é como o vinho, tem safra e terroir. Com a diferença que, no caso do mel, no mesmo terroir podemos ter várias safras anuais com vários sabores, cores e texturas bem diferentes. Por tudo isso acho que o Selo Arte só virá somar e melhorar a qualidade do mel pelo potencial gastronômico e medicinal. E as portarias do Ministério da Agricultura vão disciplinar a produção e evitar as distorções no trânsito de espécies nativas pelo Brasil”, considera Cláudia Lopes, bacharel em Biologia, ambientalista, produtora rural, pequena produtora de mel e proprietária de mercearia virtual, além de degustadora de mel profissional.
O que Lopes vislumbra se torna planejamento de negócio para outro produtor, que também comemora as novidades relacionadas ao Selo Arte, enquanto antecipa os próximos passos que pretende implementar em sua operação.
“Construirei a casa do mel, para fazer a produção e processamento todo no local. Pretendo abrir um PRONAF, para ampliar para a criação das abelhas locais. Estou no Vale do Ribeira, região privilegiada para o mel orgânico, pois não há nenhuma fábrica poluidora por perto. E o vento que corre por aqui impede a interferência de poluentes. É favorável ao orgânico”, comenta Almir Rogério Moreira Pinheiro, produtor apícola, em Barra do Turvo, São Paulo.
Segundo Pinheiro, a regulamentação contorna uma dificuldade histórica enfrentada pelo setor, que é a falta de confiança do consumidor final. Neste sentido, Lopes lembra que muito precisa ser feito: “ainda existe uma grande informalidade entre os produtores rurais e é muito difícil alcançar um padrão de uniformidade de higiene, embalagens, e que todos cheguem a ser registrados, possuir o SIF ou outros selos de inspeção.” O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento anunciou a publicação de um manual de boas práticas para a apicultura e para a meliponicultura, que deverá ser disponibilizado eletronicamente, pelo site do Ministério.
Em entrevista exclusiva, concedida ao Jornal Conafer, Marcela Teixeira, Coordenadora Geral de Produção Animal, na Secretaria de Inovação e Desenvolvimento Rural e Irrigação do Ministério da Agricultura, reconhece o valor da artesanalidade dos produtos e revela que a criação do Selo Arte surgiu por uma demanda da sociedade. Segurança e diversidade A novidade alcança aspecto biológico importante, uma vez que refreia os riscos implicados pela retirada de espécies nativas de abelhas e reposicionamento das mesmas em regiões nas quais não são nativas, conforme detalha Laila Ubbi Baldochi, Bióloga, produtora rural orgânica e meliponicultora e consultora de um sistema participativo para certificação orgânica.
“A limitação geográfica que a portaria traz para a criação de abelhas sem ferrão também é uma coisa positiva. Já que está havendo um verdadeiro tráfico de abelhas dentro do Brasil. Estão trazendo e levando abelhas nativas de um lugar para outro e isso traz muitas preocupações. Espécies que são nativas de uma região, ao serem levadas para outra região, podem se tornar invasoras. E há doenças também, que podem ser transportadas, inclusive doenças de Apis mellifera (abelhas com ferrão), que já estão aparecendo em abelhas sem ferrão. A exemplo o vírus da cria pútrida e também o vírus das asas deformadas. Porque quando o produtor começa, às vezes por falta da própria indústria, ele vende o mel para os entrepostos, esse mel é homogeneizado, ou seja, as floradas não são valorizadas. Então você tem uma diversidade de méis que se fossem envasados separadamente teriam um valor muito maior, tanto para o produtor, quanto para o agricultor. E isso traz uma consciência em relação à biodiversidade e sua importância. E isso a gente considera muito especial, porque a produção a nível de quilos é muito diferente da apicultura, assim como as propriedades nutricionais. O mel das abelhas sem ferrão tem várias propriedades medicinais, possui mais água, pode conter traços de pólen, são infinitas as avaliações sensoriais. Isso engrandece novamente, para o produtor e para o consumidor. Popularizar esse tipo de produto é difundir uma riqueza em abelhas sem ferrão. O Brasil tem uma grande diversidade de espécies e muitas pessoas sequer conhecem isso porque não tiveram a oportunidade, porque o produto não chegou nas prateleiras”, pondera Baldoch.
Aspectos controversos Os avanços conquistados pela nova portaria não a isentam das polêmicas. Segundo Baldoch, há espécies não mapeadas em áreas de transição que acabam desconsideradas pela novidade, em função da exigência de comercialização de produtos reconhecidamente locais. “Exigir que os produtos comercializados sejam apenas de produções locais traz uma polêmica porque têm espécies, principalmente em áreas de transição, que elas ocorrem ali, mas não há uma descrição da ocorrência, então isso pode ser ruim para o produtor. Isso demanda que o produtor conheça as espécies locais, não apenas busque uma pelo seu valor econômico. E a difusão do comércio do mel não garante a responsabilidade do meliponicultor hobbista ao adotar colônias”, esclarece a especialista.
Por: Raquel de Andrade, com colaboração de Isabelle Daru Bisoni