da Redação
Hoje, 28 de abril, é a data em que se comemora anualmente no Brasil o Dia Nacional da Caatinga, bioma que ocupa 844,4 mil quilômetros quadrados, ou 11% do território brasileiro, com predominância na maior parte do Nordeste e áreas de Minas Gerais. A data, oficializada por meio do Decreto de 20 de agosto de 2003, foi criada com o intuito de conscientizar as pessoas sobre a importância de sua preservação para o equilíbrio ambiental. Ela é o único bioma exclusivamente brasileiro, e sua originalidade está na paisagem formada pela vegetação esbranquiçada por ocasião dos longos períodos de estiagem. O cerne da economia das comunidades que habitam este ecossistema está na agricultura familiar, com cultivo de lavouras, criação de animais, atividades de extrativismo vegetal e outras formas de produção, sobretudo com a pecuária de pequeno e médio porte com foco na ovinocaprinocultura. Neste bioma, a produção agrícola se dá em mais de 1.6 milhão de propriedades rurais, representando, de acordo com o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 32% dos estabelecimentos rurais brasileiros, sendo que, deste total, 78,9% possuem no máximo 20 hectares. A Caatinga abriga mais de 28 milhões de pessoas nos estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Maranhão e parte da faixa norte de Minas Gerais. Preservar a sua biodiversidade, apesar da sua exploração econômica, deve ser um compromisso de toda a sociedade brasileira, incluindo-se a CONAFER, que tem incentivado as práticas agroecológicas entre seus agricultores familiares associados, principalmente indígenas e quilombolas que habitam a região, no intuito de conciliar a preservação do bioma com o fortalecimento da economia local, gerando mais renda e desenvolvimento social para estas comunidades
O nome Caatinga tem origem no tupi-guarani, e significa floresta branca, em uma referência a cor predominante assumida pela vegetação durante o período de seca, que ocorre normalmente durante a estação do inverno, no qual todas as plantas perdem suas folhas para diminuir a transpiração e evitar a perda de água armazenada. Afora a imensidão de sua biodiversidade vegetal e animal, que conta com espécies como a Ararinha-azul, ameaçada de extinção, este bioma também é dono de uma vasta diversidade cultural, estruturada pela contribuição dos povos originários da região.
A Caatinga é o lar de 60 povos indígenas, que fazem da agricultura familiar sua principal fonte de renda e subsistência, estando metade deles na região da bacia do Rio São Francisco, um dos rios mais importantes desse ecossistema. Entre os povos originários que habitam o local estão os Atikum, Fulni-ô, Jenipapo-Kanindé, Jiripancó, Pankararé, Pitaguary, Tingui Botó, Truká, Tumbalalá, Xakriabá e Xukuru, entre muitos outros, todos eles profundos conhecedores da Caatinga e responsáveis por sua conservação.
A originalidade presente na vegetação da Caatinga está na contradição que une a resiliência das plantas à fragilidade de sua degradação, causada ao longo de centenas de anos de ocupação, desde o primeiro contato português no país. Ela foi primeira área do interior do país a ser desmatada, e ter suas riquezas usufruídas em prol do lucro dos exploradores europeus, que modificaram este ecossistema introduzindo espécies invasoras e, implementando sistemas econômicos de produção pecuarista, por volta do século XVI, ocasionando a formação de um clima semiárido e seco.
Apesar das dificuldades para reprodução da vida neste ambiente seco, os agricultores familiares e os povos das comunidades tradicionais conseguem desenvolver suas bases produtivas, e agregam aos seus produtos valores étnicos, históricos, sociais, culturais e ambientais. É na comercialização de itens como o umbu, o licuri, o caju, a mangaba, o mandacaru, o maracujá-da-caatinga, e o mel extraído de vários tipos de abelhas nativas, que eles encontram uma oportunidade para desenvolver socioeconomicamente suas comunidades, integrando a produção sustentável e geração de renda ao empoderamento das populações extrativistas e agrofamiliares.
Na Caatinga, a expressão “tirar leite de pedra” é parte da rotina diária dos produtores rurais, que dependem de investimentos e tecnologias para produzir em um solo raso e pedregoso, e com isso superar a pobreza e a fome. Seja aproveitando os frutos da vegetação nativa, praticando a agricultura orgânica, a pecuária sustentável ou usando práticas comunitárias de produção, as comunidades rurais fazem da caatinga o seu meio de vida e sustento das famílias, desenvolvendo suas atividades por meio de práticas que respeitam os ritmos da vida deste bioma.
Durante as últimas décadas, houve um aumento da pressão sobre a exploração dos recursos naturais da Caatinga devido, principalmente, ao consumo de lenha nativa, que vem sendo explorada de forma ilegal e não sustentável para fins domésticos e industriais. O sobrepastoreio também é outro problema que pode gerar a extinção de espécies da fauna e flora desse bioma, pois expõe as plantas ao pastoreio intensivo durante longos períodos, de modo que torna insuficiente o tempo para a necessária recuperação do solo e ambiental.
Ainda falta engajamento no país para avançar com políticas públicas que atuem na recomposição da paisagem e recuperação das áreas degradadas do bioma. Em 2018, tramitou na Câmara de Deputados o Projeto de Lei 9076/17, que tinha como objetivo a proteção ambiental do ecossistema da Caatinga, estipulando meta de preservação, proibição de desmatamento e determinando o seu zoneamento ecológico-econômico (ZEE). Porém, o projeto acabou sendo devolvido pelo relator sem manifestação e arquivado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS).
O Decreto que institui a criação do Dia Nacional da Caatinga também atribui ao Ministério do Meio Ambiente a responsabilidade pela promoção e organização de ações próprias para conscientizar a população sobre a importância de se preservar este bioma. Outra curiosidade sobre a data é que ela é uma homenagem ao dia de nascimento do professor João Vasconcelos Sobrilho, um dos pioneiros nos estudos ambientais no Brasil, que contribuiu em vida para despertar nas pessoas o sentimento de cuidado e amor ao meio ambiente.
Potencial produtivo da Caatinga
Este ecossistema é uma fonte interminável para a elaboração de produtos baseados na sua biodiversidade, e possui um enorme potencial, por exemplo, para a fabricação de fitoterápicos e fármacos, a exemplo das três espécies vegetais consideradas promissoras para o mercado de cosméticos naturais, de acordo com mapeamento realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Ministério da Agricultura (Mapa), como o extrato de melão de São Caetano, o extrato de arnica e a cera de carnaúba, que se encontram entre as 26 cadeias de valor identificadas pelo projeto “ArticulaFito – Cadeias de Valor em Plantas Medicinais”, considerado o maior mapeamento de plantas medicinais, aromáticas, condimentares e alimentícias elaborado no país.
A produção agrofamiliar dos povos indígenas neste bioma tem como destaques: no mês de janeiro, o caju e o Ouricuri/licuri; em fevereiro, a maturação da ubaia/uvaia; de março a abril, o cajá e o juá; de maio a junho, o jenipapo, goiti e as bananas; de setembro a outubro, a canafístula; em novembro, o maracujá do mato; e, em dezembro, a gabiroba. Além dessas, são cultivadas outras culturas que não são nativas, e que estão presentes nas lavouras durante o ano todo, como a manga, jaca, limão, tamarindo, uva, acerola, carambola, pinha, coco, fruta-pão, laranja, jamelão.
A quantidade de estabelecimentos agropecuários que se dedicam à pecuária familiar e criação de outros animais está estimada, segundo um levantamento feito pela Embrapa, em aproximadamente 850 mil, representando mais da metade das propriedades rurais do bioma. Já a produção em lavouras temporárias é praticada em cerca de 630 mil propriedades rurais, representando 37,7% dos estabelecimentos agropecuários da Caatinga.
Com informações do Mapa e da Embrapa.