FONTE: Século Diário
Poços foram contaminados em 2015. Fundação Renova fornece apenas 5 litros de água por pessoa por dia
 
Água com arsênio para tomar banho, lavar roupa, alimentar os animais de criação e estimação, aguar as plantas. Essa é a realidade dos moradores da comunidade quilombola de Degredo, em Linhares, norte do Estado, desde que a lama tóxica de rejeitos de mineração da Samarco/Vale-BHP atingiu o rio Ipiranga.
Um estudo contratado pela Fundação Renova encontrou arsênio em 34 poços da comunidade. Em 16 deles, é impossível retirar o metal pesado e, em 18, o custo do tratamento da água inviabiliza o processo.
O resultado foi divulgado há alguns dias, quando as vigilâncias sanitárias municipal e estadual notificaram as famílias proprietárias dos poços contaminados, para que elas não façam mais uso.
“A gente tomou um choque. Pensamos: será que vamos ter que sair daqui? Demorou tanto tempo pra conseguirmos o que é nosso!”, suplica o estudante de Arquitetura Jadilson Lino de Olveira Gomes, referindo-se ao reconhecimento do Degredo como comunidade quilombola, que só aconteceu em 2016.
A interdição dos poços, no entanto, que seria o correto, ainda não aconteceu porque os moradores afetados não possuem outra fonte de água, já que nem a Prefeitura de Linhares nem a Fundação Renova estão levando água potável para a comunidade. “A Vigilância Sanitária diz que a gente não pode usar a água, mas como não tem outra solução, continuamos fazendo uso dela”, conta Jadilson.
De fato, apenas em agosto de 2018 que a Fundação Renova passou a fornecer cinco litros de água por pessoa por dia. O pedido feito pela Comitê Interfederativo foi de quinze litros, mas ela não cumpriu. A alegação é que só é necessário fornecer água para beber e cozinhar.
“O certo seria o caminhão-pipa abastecer as caixas d’água”, contesta Mônica Silva, moradora que, felizmente, não teve seu poço contaminado.
O sentimento, diz, é de tristeza e de revolta. “Tristeza porque estou vendo os rios e as nascentes mortas, porque mesmo ainda saindo água das nascentes, é uma água morta. E revolta porque eles dizem que não há nexo causal [a Fundação Renova diz que não há provas de que o arsênio encontrado na água de Degredo tenha origem na lama de rejeitos]. E o meu desconforto e a minha saúde como ficam?”, protesta Jadilson, lembrando que não pode mais exercer a primeira profissão, de pescador, devido à contaminação do rio e do mar.
O laboratório contratado pela Renova analisou 80% dos 178 poços do Degredo, a pedido da comunidade, que há muito vinha sentindo mudanças na qualidade da água.
“A água está com cheiro diferente e mais amarelada. E provoca coceira na pele depois de tomar banho ou lavar o rosto. Estou com manchas avermelhadas no rosto”, relata o estudante, lembrando que há muitos moradores com dermatites diversas, que atribuem à contaminação da água pela lama de rejeitos.
Mônica observa que a maioria dos poços mais contaminados estão localizados próximos do Rio Ipiranga, que corta a comunidade, e foi atingido pela lama tóxica através de sua foz. Na época de seca, o mar invadiu a foz, levando os rejeitos da Samarco/Vale-BHP pra dentro do Ipiranga e dos poços dos moradores.
“A insegurança hídrica das pessoas é muito grande. Já apareceram coceiras, dermatites, há muito tempo. E agora, com esse resultado sobre arsênio, o dano psicológico é enorme. Muitas pessoas em desespero, gente querendo ir embora, depois de tanta luta”, lamenta.

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