Consea é o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, órgão extinto em 2019, mas que foi recriado por medida provisória publicada em 1º janeiro no Diário Oficial da União. A sua gestão é composta por dois terços de representantes da sociedade civil e um terço do governo. Suas ações são voltadas à defesa, promoção e garantia do direito humano à alimentação adequada e saudável. Com o seu retorno espera-se a volta de programas fundamentais para a Segurança Alimentar e Nutricional, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), a retomada da merenda escolar em alta escala, a gestão de estoques públicos de alimentos e o fortalecimento da rede de proteção social para retirar o país novamente do Mapa da Fome. Hoje, 33 milhões de brasileiros não fazem as suas refeições diárias, resultando no mais elevado nível de insegurança alimentar das duas últimas décadas
O texto da emenda publicada no primeiro dia de 2023, informa que as regras de funcionamento do Conselho serão definidas em ato do Poder Executivo Federal. O mais importante é que o Consea voltou para propor estratégias eficazes de combate à fome, dando voz aos agentes sociais para construir soluções que recoloquem o país em níveis satisfatórios de segurança alimentar e nutricional.
Com a volta do Consea, espera-se um fortalecimento das ações voltadas ao segmento agrofamiliar brasileiro,
com o retorno dos investimentos no Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).
Por meio do PAA, o governo compra alimentos diretamente da agricultura familiar para distribuir nas periferias e regiões de alto índice de desnutrição. Há 10 anos, o valor investido no programa chegou em R$ 585 milhões em todo o país, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Considerando o montante de recursos repassados para estados e municípios, o valor chegou a R$ 840 milhões no mesmo período. Hoje, os valores não ultrapassam R$ 50 milhões.
Outra forma de fomento importante na agricultura familiar é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), que financia as merendas escolares das redes públicas de ensino municipais, estaduais e federal – abrangendo os diferentes níveis: educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos. Uma das exigências do programa, fruto da mobilização social, é de que no mínimo 30% do valor repassado pelo governo federal, no âmbito do Pnae, seja utilizado para a compra de alimentos diretamente da agricultura familiar. Porém, desde 2017, a verba destinada ao Pnae não é reajustada pelo governo federal. Atualmente, a depender da categoria da unidade de ensino, o programa destina por aluno ao dia, entre R$ 0,32, no caso do ensino médio, e R$ 1,07, no caso das creches. Recentemente, vimos na mídia relatos de crianças dividindo bolachas nas refeições no ensino público.
Com o Consea, as organizações da sociedade civil e movimentos sociais têm de volta seus espaços de participação em debates sobre as violações do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas. Espera-se a implementação, acompanhamento, controle e financiamento das diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, levando em conta as propostas do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. O Consea é considerado um marco na história da Nova República brasileira por sua capacidade de garantir a existência de uma política de Segurança Alimentar e Nutricional aos brasileiros. A reativação deste órgão põe uma luz na luta pelo fim da fome e da miséria em nosso país.
Como conta a historiadora e doutora em História Social, Denise De Sordi, “instalado em maio de 1993, ainda no governo de Itamar Franco (1992-1994), o Conselho teve por função equilibrar o processo de transição democrática, unindo sociedade civil, movimentos sociais e governo em torno de discussões que se conectaram no combate à fome. A proposta de criação do Consea – em resumo – emergiu da convergência de diversas mobilizações e reivindicações sociais que corriam no início dos anos de 1990, e que propunham a criação de uma Política de Segurança Alimentar e Nutricional.
Com composição majoritária de representantes da sociedade civil somados aos ministros, o Consea dos anos de 1990 teve por função avaliar, orientar e propor políticas públicas orientadas em torno de eixos garantidores de condições mínimas de sobrevivência aos trabalhadores.
Ao promover espaços de discussão nacionais, permitiu a criação de um espaço público para que diferentes propostas e reivindicações pudessem ser consideradas.
Neste período, com a divulgação do primeiro Mapa da Fome, o Consea teve por mérito colocar a problemática da fome como uma questão política nacional. As idas e vindas do Conselho desde a década de 1990 estiveram, portanto, orientadas pelas mudanças das políticas econômicas dos governos e por suas prioridades em alinhar o crescimento econômico ao desenvolvimento social.”
Ainda segundo Denise De Sordi, “a notícia do retorno do Consea em 2023, como um dos primeiros atos do governo, é uma conquista e também uma janela de oportunidades. Entre os anos de 2019 e 2022, os movimentos sociais, dentre outros e a exemplo, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), o Movimento Sem Terra (MST) e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), foram responsáveis pela mobilização social de campanhas nacionais que abriram cozinhas solidárias pelo país, pela distribuição de cestas básicas em larga escala e, principalmente, pela proposição de uma Política de Segurança Alimentar que permite conectar a ideia entre trabalho, alimentação e condições dignas de existência. Por isto, a reabertura do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA) é também peça-chave na sinalização de políticas que lidem com o combate à fome e à pobreza de ponta a ponta.”
Para De Sordi, “o retorno do Conselho traz a possibilidade de ações integradas com políticas públicas que se expressem em melhorias nas diversas dimensões do social: alimentação, saúde, emprego, renda e educação como dimensões integradas da vida em sociedade, promovendo a concretização de políticas públicas sociais de Estado para o combate à pobreza – que é geradora da condição de fome – tanto no campo, quanto na cidade.”
Com informações de CartaCapital, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Brasil de Fato e UOL (com matéria da historiadora e doutora em História Social, Denise De Sordi)