Desde 20 de junho de 1979, uma sobreposição de matrícula ilegal em uma área registrada desde 1956 em nome da herdeira indígena Terezinha dos Santos, repete a história de ocupação dos colonizadores há 523 anos, coincidentemente no sul baiano, palco da invasão portuguesa. As vítimas do último ato de violência são os indígenas Pataxó da comunidade de Itacipuera, no Distrito de Trancoso, em Porto Seguro. O documento legal da área comprova a posse indígena, o que contraria os interesses de quem os quer bem longe de sua comunidade. O ataque desferido no último dia 29 de dezembro de 2023 é uma prova do risco que os Pataxó estão correndo, mesmo com a ilegalidade da propriedade de 131,4 hectares ser sobreposta por uma matrícula irregular de 1979, com área de 2.944,39 hectares do Conjunto Rio dos Frades, propriedade da Agro-Pastoral Itaquena, do cônsul de Portugal, em Porto Seguro, Moacyr Andrade. O Coordenador Regional da FUNAI do sul da Bahia, cacique Aruã Pataxó, informa que por motivos de segurança, os indígenas saíram da área sob ameaça, pois os homens fortemente armados que atiraram e incendiaram a comunidade, prometeram voltar. A FUNAI encaminhou denúncia, e as polícias Civil e Federal já investigam o caso
O grupo encapuzado que invadiu a comunidade de Itacipuera, além dos tiros e destruição de documentos e bens dos indígenas, ainda ameaçou a todos dizendo que iriam morrer caso permanecessem no local do ataque.
O cacique Aruã Pataxó, coordenador regional da FUNAI do sul da Bahia, informa que esteve na comunidade no dia seguinte, sábado (30), quando se reuniu com as famílias, colhendo depoimentos, levando os indígenas na delegacia de polícia civil de Trancoso para fazer a ocorrências, além do contato com a delegacia de Polícia Federal.
De Porto Seguro, foi encaminhada toda a documentação e depoimentos para a abertura de uma investigação. O delegado de Trancoso colheu o depoimento de três vítimas e disse que irá fazer diligências na comunidade de Itacipuera. Há uma busca por imagens de câmeras que possam identificar os veículos ou pessoas que transitaram naquela localidade e efetuaram o ataque armado às 16 famílias indígenas que estão lutando pelos seus direitos sobre a área.
Uma família indígena tem formalmente o documento em cartório de imóveis atestando que a Fazenda Itacipuera, de 131,4 hectares, está em nome da herdeira indígena Terezinha dos Santos. Porém, desde 2017 que uma sobreposição de matrícula ilegal em nome do cônsul de Porto Seguro, Moacyr Andrade, pretende integrar a área indígena aos seus 2.944 hectares. Com este documento irregular, os criminosos querem legitimar esta invasão, sem direito nenhum à herdeira e aos Pataxó. A forma encontrada pelo cônsul Moacyr Andrade para burlar a lei, foi realizar uma espécie de comodato com o invasor Eudes Cunha, que está na área de conflito.
Por motivos de segurança, as 16 famílias indígenas saíram de sua comunidade sob ameaça de tiros, pois os homens fortemente armados afirmaram que voltariam para matar todo mundo. Eles portavam armas de grosso calibre e grande poder de fogo, como espingardas 12 e pistolas 380. Depois de intensa pressão psicológica sobre homens, mulheres, crianças e idosos, atearam fogo e destruíram casas, 3 motos, 1 geladeira, 3 celulares, documentos, bens e pertences dos indígenas.
A Coordenação da FUNAI – CR-SBA fez uma reunião com os indígenas para ouvir e colher depoimentos das vítimas. Em contato com a Polícia Federal e Polícia Civil, apresentou os indígenas para depoimentos, a fim de abertura de investigação e inquérito policial, no objetivo de apurar os fatos, identificar e levar os agressores à Justiça.
Atualmente, a disputa judicial está entre a legítima proprietária e herdeira das terras da Fazenda Itacipuera, a indígena Terezinha Neves dos Santos e Eudes Mezzedimi Cunha. O cônsul de Portugal em Porto Seguro-BA, Moacyr Andrade, cedeu em comodato a Eudes as terras da Fazenda Itacipuera. A FUNAI, oficiou às autoridades de Estado, sobre o conflito e risco de novos ataques. E manifestou, no processo judicial em defesa dos direitos indígenas, o pedido de declínio de competência do Juiz Estadual, para postular a remessa do feito à Justiça Federal.
Veja a parte do documento encaminhado pela FUNAI ao Ministério dos Povos Indígenas, Secretaria de Segurança Pública da Bahia, Procuradoria Federal, Polícia Federal, Polícia Militar, Ministério Público e Defensoria Pública, relatando o atentado criminoso:
“Ocorre porém, que no dia 29/12/2023, por volta das 22:00 horas, na área de ocupação territorial denominada Comunidade Indígena Pataxó Itacipuera, os indígenas foram surpreendidos, por 06 (seis) homens fortemente armados com arma de fogo de grosso calibre, espingardas/escopeta 12 e pistolas 380, desferiu ataque a tiros contra 16 famílias Pataxó, entre mulheres, crianças, jovens, anciãos e adultos. Além, de atear fogo e destruir as casas dos indígenas, queimaram 03 motocicletas, 03 celulares, 01 geladeira, documentos, bolsas, roupas e pertences pessoais. As famílias indígenas foram expulsas da área sob fortes ataques e ameaças violenta de arma de fogo, tiros e agressões verbais, dizendo se voltasse novamente todos iriam morrer. Mulheres e crianças entraram, em estado de choque e ficaram traumatizados, com essa ação violenta. A Coordenação Regional da FUNAI do Sul da Bahia – CR-SBA e a Coordenação Técnica Local – CTL de Porto Seguro/BA, esteve novamente no local da ocupação da Comunidade Indígena Pataxó Itacipuera na manhã do sábado, 30/12/2023, onde realizou reuniões e entrevistas com às vítimas para ter maiores informações do ocorrido. E, em contato com a Polícia Federal de Porto Seguro e Polícia Civil de Trancoso, apresentou os indígenas para depoimentos e registrar a ocorrência, a fim de investigação e abertura de inquérito policial, no objetivo de apurar os fatos, identificar e levar os agressores à Justiça. A Fazenda Itacipuera possui uma área de 131,4 hectares, pertence a uma família Pataxó, com Registro no Cartório de Imóveis, código do imóvel, 951.145.118.710-1, NIRF: 9.581.853-7, datado de 15/06/1956, nominal ao Srº. Gregório Bispo dos Santos, avó da indígena, Terezinha Neves dos Santos, que adquiriu a posse da Fazenda Itacipuera, em cessão de Boa Fé, conforme Escritura Pública de Cessão e Transferência de Herança, entre José Gonçalves dos Santos e Gregório Bispo dos Santos, em 15/06/1956, ato registrado em cartório, no município de Porto Seguro, Termo da Comarca de Belmonte/BA, no Livro nº. 37, Nº. 140, FLs. V140/141V, Certidão Passada e Averbada. Porém, a propriedade indígena, foi sobreposta por uma matrícula datada de 20/06/1979, com área de 2.944,39 hectares, matrícula nº. 2.520, datada de 20/06/1979, imóvel denominado de CONJUNTO RIO DOS FRADES, situado no município de Porto Seguro/BA. Tendo como domínio, ação e posse à FIRMA AGRO-PASTORAL ITAQUERA S/A, tendo como Diretores, MOACYR COSTA PEREIRA DE ANDRADE, SYLVIA DE ANDRADE HARRIS E ABERTO MOACYR PEREIRA DE ANDRADE. Desde 2017, a Fazenda Itacipuera, é objeto de disputa judicial, entre a indígena Terezinha Neves dos Santos e Eudes Mezzedimi da Cunha. O Cônsul de Portugal em Porto Seguro/BA, MOACYR COSTA PEREIRA DE ANDRADE, cedeu em comodato as terras da Fazenda Itacipuera, a EUDES MEZZEDIMI DA CUNHA, como forma de recompensa por tempo de serviço, superior há uma década. A FUNAI – CR-SBA, oficiou às autoridades de Estado, sobre o conflito e risco de ataque iminente contra as famílias indígenas. E, as famílias por meio de advogado particular, manifestou no processo judicial, por meio de parecer técnico da FUNAI, em defesa dos direitos indígenas, em pedido de declínio de competência ao Juiz Estadual da Comarca de Porto Seguro/BA, para postular a remessa do feito à Justiça Federal.”
Assista aos depoimentos de algumas das vítimas do ataque à comunidade Itacipuera, no Distrito de Trancoso, em Porto Seguro-BA, ocorrida no último dia 29 de dezembro de 2023: