Por Cleyton Calisto
Na década de 50 teve início um conflito político envolvendo diversos atores na Baixada Fluminense. A necessidade de ampliar o conhecimento sobre esse conflito deu origem às palavras ‘posseiros’ e ‘grileiros’, mas quem são essas pessoas?
Apesar da região (principalmente os municípios de: Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Magé, Itaguaí, Itaboraí e Cachoeiras de Macacu) ter sido ocupada no séc XVI, no decorrer do tempo a produção agrícola acabou sendo distribuída pouco a pouco para outras regiões e estados. Passando os anos pouquíssimos investimentos em infraestrutura e manutenção foram realizados, levando as terras à uma aparência de nunca terem sido trabalhadas para o plantio. Esse cenário muda de figura somente nos anos 30.
Através de parcerias governamentais se constrói a Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense (1933), com o plano de tornar essas terras um celeiro para o Distrito Federal e para o próprio Estado. Com investimentos em infraestrutura e saneamento básico, incentivo do governo e a proposta de terras para plantar, diversas famílias passaram a ocupar esses terrenos. Era comum trabalhadores chamarem ou voltarem com suas famílias e por ali se instalarem após trabalhar nas diversas obras na região. Alguns eram nativos da região que, vendo novamente a oportunidade de trabalhar e cuidar das terras, decidem voltar.
O plano apoiou o desenvolvimento de famílias já estabelecidas nas terras há muito tempo e permitiu diversas famílias sem terras a terem seu espaço para plantar e viver. Porém, por conta dos investimentos, antigos donos e especuladores imobiliários acompanham o crescimento das cidades ao redor e começam a proclamar as terras para si, não com o objetivo de produzir, mas visando a especulação imobiliária da região. Assim o conflito surge e se intensifica nas décadas seguintes.
Os especuladores, utilizando meios legais e burocráticos, proclamavam para si terras já ocupadas há anos e ao assumirem essas terras a primeira ação sempre era destruir as plantações e pomares. Surge então duas palavras: Posseiros(as), servindo para todas as pessoas e famílias que já detinham a posse dessas terras: como famílias e povos tradicionais, assim como trabalhadores civis e agrícolas, cultivadoras dessas terras; e Grileiros, servindo as pessoas não pertencentes à região e interessadas em desocupar essas famílias. O termo “grileiro” vem da prática de falsificar documentos de terras, utilizando uma técnica de colocar os papéis em uma caixa com grilos, para que eles adquiram um aspecto envelhecido.
O conflito gera diversas desapropriações quando os grileiros, se utilizando de meios legais, converteram a máquina estatal à seu favor. Além de pagar jagunços e capatazes para ameaçar, machucar e assassinar posseiros, também pagavam mídias e jornais da época para colocarem a capital e os municípios aos arredores contrários às famílias posseiras.
Essas famílias enquanto movimento responderam articulando uma força tarefa jurídica para auxiliar os posseiros a registrar e legalizar suas terras, se utilizando da mesma arma burocrática usada pelos grileiros. Montam também organizações sociais populares para apoio, auxílio, investimento e proteção mútua. Periodicamente faziam manifestações públicas nos municípios vizinhos e na capital e sempre com muitos alimentos, todos plantados e cultivados pelas famílias, com o objetivo de mostrar à opinião e poder público a produção e a legitimidade dessas famílias nessas terras.
Apesar de muitas familias terem sido desapropriadas na época, o número de estabelecimentos rurais controlados pelas famílias posseiras só cresceu com as décadas. A vitória foi popular! De um número quase insignificante (anos 40) subiu para 253 (anos 50) e chegou à 1.596 (anos 60). As famílias posseiras ganharam força ao ponto de se tornarem pauta de debate dos presidenciáveis da época. Políticos conhecidos por serem contrários a essas famílias decidem atuar em prol delas, abrindo mão de terras e pressionando outros grileiros a fazerem o mesmo. Políticas públicas são feitas para apoiá-las ainda mais e o clima seguia favorável até 1964, quando assumem os militares e a política brasileira muda totalmente.
Baseado no capitulo: “Ação política e atores sociais: posseiros e grileiros e a luta pela terra na Baixada Fluminense”, de Mario Grynszpan. Do livro: Lutas Camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas.
A Confederação da Agricultura Familiar