O Relatório de Conflitos no Campo no Brasil 2024, publicado pela Comissão Pastoral da Terra, CPT, aponta que o número de conflitos no campo alcançou o maior patamar da última década, com 1.768 casos registrados, superando os dados de 2023. Os povos indígenas são os mais afetados, representando 29% das vítimas diretas de violência por terra e liderando também os conflitos pela água, com 71 ocorrências. Estados da região amazônica, como Maranhão, Pará, Rondônia e Amazonas, concentram os maiores índices. O relatório, elaborado pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno, Cedoc, revela que a violência no campo está ligada à histórica luta pelo direito à terra, agravada recentemente pela promulgação da Lei 14.701/2023, que institui inadvertidamente a tese do marco temporal. Em 2023, por 9×2, essa tese já havia sido considerada inconstitucional pelo STF, que decidiu a favor dos povos originários. Mas a inconsistência da decisão sobre a inconstitucionalidade do marco temporal na demarcação de terras indígenas, ainda discutida em uma mesa de conciliação no STF, intensifica a insegurança nas aldeias, facilitando despejos, anulando demarcações e enfraquecendo os direitos dos povos originários
A demora na demarcação de terras indígenas e a falta de uma definição clara do Supremo Tribunal Federal, STF, sobre a inconstitucionalidade do marco temporal, aumentam a violência contra os povos indígenas. Sem as terras oficialmente reconhecidas e protegidas, essas comunidades ficam mais expostas a invasões de garimpeiros, pistoleiros e outras pessoas que disputam o território. Isso gera conflitos que muitas vezes acabam em atos de violência e homicídios. Como resultado, os povos indígenas ocupam a linha de frente em uma disputa marcada pela desigualdade, sendo os mais atingidos pela violência no campo. Eles representam 29% das vítimas diretas em conflitos por terra, índice superior ao de outros grupos como posseiros e quilombolas. Além disso, também lideram os casos de conflitos relacionados à água, com 71 episódios registrados.

Foto: Agência Brasil
Segundo o relatório, em várias regiões do Brasil, povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais estão sofrendo com diferentes tipos de violência, como tiros, queimadas e uso de veneno. Na região do Matopiba, que inclui os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, foram registrados 415 conflitos por terra, o maior número já registrado. Os conflitos por água também aumentaram, passando de 23 para 39 casos. No Maranhão, os casos de contaminação por agrotóxicos cresceram muito, subindo de 32 em 2023 para 276 em 2024, um aumento de 762 por cento, afetando principalmente comunidades indígenas e tradicionais.

Indígenas Yanomami fazem manifestação contra garimpo nas terras indígenas – Foto: Victor Moriyama / ISA
A região da Amazônia Legal teve 998 conflitos por terra e 155 por água, além de ser a mais atingida pelos incêndios no país. O estado do Mato Grosso foi o que mais registrou focos de fogo, com 25 por cento de todos os casos do Brasil. Um exemplo grave é a Terra Indígena Kayapó, no Pará, que teve 3.246 focos de incêndio até setembro de 2024, de acordo com dados do Greenpeace Brasil. Em muitos desses casos, o fogo foi usado de forma intencional para expulsar as comunidades e abrir caminho para invasões e atividades ilegais, como o garimpo.

Foto: Denisa Starbova
Diante de todos esses dados, o Relatório de Conflitos no Campo no Brasil 2024, mostra uma situação muito preocupante. Os povos indígenas continuam sendo os mais afetados pela violência no campo e estão constantemente ameaçados em seus direitos, sua cultura e seu modo de viver. A morosidade para demarcar oficialmente as terras e a insegurança causada pela tese inconstitucional do marco temporal fazem com que os conflitos nas aldeias aumentem e fiquem cada vez mais violentos. Em muitos casos, as comunidades indígenas são atacadas, expulsas de seus territórios e sofrem com queimadas, agrotóxicos e invasões. Sem suas terras reconhecidas e protegidas, os povos originários ficam vulneráveis e sem segurança. Proteger os territórios indígenas e garantir os direitos que estão na Constituição é fundamental para mudar essa realidade.

Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
A Secretaria Nacional de Povos, Comunidades Tradicionais e Política Social, a SEPOCS da CONAFER, apoia os indígenas de todo o país, de forma permanente, com ações sociais e educativas, promovendo os direitos dos povos originários. Além disso, a Confederação segue defendendo o marco ancestral contra o marco temporal. A CONAFER também atua diretamente na articulação com lideranças indígenas, órgãos públicos e instituições de defesa dos direitos humanos, contribuindo para a construção de políticas públicas voltadas à proteção dos territórios e à preservação das culturas tradicionais.