da Redação
O presidente do TSE, ministro Roberto Barroso, que já atuou pela defesa dos povos indígenas durante a pandemia como ministro do STF, tem agora uma nova oportunidade de impedir mais um ato de criminalização contra um indígena
Caso tivéssemos de escolher uma das cenas mais emblemáticas e emocionantes destas eleições municipais no Brasil de 2020, muito provavelmente destacaríamos a cena da vitória do cacique Marquinhos, na cidade de Pesqueira, no Agreste de Pernambuco.
As imagens que correram o país mostram milhares de indígenas, juntos com boa parte dos moradores da cidade, dançando e cantando nas ruas, felizes com o resultado e com a nova perspectiva de mudanças no cenário político, principalmente, pelo desastre sócio-econômico que o munícipio vive por seguidas más administrações, prefeito após prefeito, e que agora tem a chance de mudar esta triste realidade com as ideias e o trabalho do cacique Marquinhos.
Depois da vitória dos Xukuru por reparação histórica na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2018, a luta é mais uma vez contra as mesmas oligarquias que há séculos criminalizam os indígenas
O cacique não foi eleito apenas pelos parentes Xukuru. Foi toda a sociedade de Pesqueira quem elegeu Marquinhos Xukuru, do Republicanos, prefeito da cidade localizada no Vale do Ipojuca. Portanto, o TSE tem a chance de reparar a decisão do TRE de Pernambuco, que indeferiu a sua candidatura, transformando uma conquista histórica em um caso sub judice.
Pesqueira tem 67 mil habitantes, dos quais 12 mil são indígenas aldeados nas terras Xukuru. Cacique Marquinhos venceu a eleição com 51,6% dos votos, contabilizando quase 18 mil eleitores.
“Representa uma mudança de perspectiva na política, onde o mais importante é o coletivo, o bem viver e a garantia da inclusão e da participação coletiva nas decisões do município”, destaca o cacique, sobre sua eleição, que recebeu o apoio de diversas lideranças durante sua campanha.
Em Brasília, Marquinhos Xukuru representa uma luta de 500 anos de crimes contra os povos originários
Líder do povo Xukuru há 20 anos, o cacique agora luta para ter o seu direito de ser empossado prefeito e reconhecido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O motivo é que mesmo com uma vitória incontestável nas urnas, justamente porque conquistou o maior número de votos, Marquinhos Xukuru teve a sua candidatura indeferida pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Pernambuco. E agora, recorre ao TSE.
A justificativa do Ministério Público Eleitoral, que propôs a ação de impugnação de registro de candidatura, foi a condenação de Marquinhos em um processo criminal – de dano ao patrimônio privado – relacionado a ações ocorridas após um atentado contra o cacique, em 2003. Vale lembrar que seu pai, cacique Xicão, foi assassinado a tiros, em 20 de maio de 1998.
Com a candidatura sub judice, cacique Marquinhos corre contra o tempo e luta para que o TSE reconheça o seu direito de ser prefeito de Pesqueira.
“Há muitos anos nosso povo luta contra os interesses das oligarquias locais e pelo direito do povo Xukuru. A cada ano essa questão fica mais acirrada, inclusive com a criminalização. De vítima de um atentado, passei a ser réu”, relata a liderança.
“Ataques e criminalização contra os povos indígenas e seus defensores no Brasil são os mais graves do mundo”, afirma relatora da ONU
O Brasil tem cerca de 818 mil pessoas autodeclaradas indígenas. São 256 povos com mais de 150 línguas diferentes. Estes grupos vem cada vez mais ampliando a participação na política. Nas eleições deste ano, houve um aumento de 90% nas candidaturas indígenas. Em 2016, foram 1.175 candidatos. Em 2020, o número subiu para 2.111.
A Relatora Especial das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, apresentou, no dia 19 de setembro, na Suíça, conclusões e recomendações sobre a situação dos defensores indígenas de Direitos Humanos.
O estudo traz informações com governos e outros atores em relação a alegações de violações dos direitos dos povos indígenas em todo o mundo e coloca o Brasil no topo de um lamentável ranking de omissão e impunidade às violações de indígenas e de defensores desses direitos.