FONTE: G1
Consea é um órgão de assessoramento da Presidência. Responsabilidade pela política nacional de segurança alimentar e nutricional ficará com o Ministério da Cidadania.
O presidente Jair Bolsonaro retirou, por meio de uma medida provisória, do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) a atribuição de propor ao governo federal as “diretrizes e prioridades” da política e do plano nacional de segurança alimentar e nutricional.
A MP 870, que reestruturou os ministérios, colocou entre as competências do Ministério da Cidadania, comandado pelo ministro Osmar Terra, a responsabilidade pela política nacional de segurança alimentar e nutricional.
A medida ainda revogou trechos da lei que trata da composição do Consea, órgão de assessoramento da Presidência da República. De acordo com a Casa Civil, o conselho (leia o posicionamento da Casa Civil mais abaixo).
A MP entrou em vigor na terça-feira (1º), ao ser publicada no “Diário Oficial da União”. A medida precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional para que não perca a validade.
As regras de funcionamento do Consea, órgão de assessoramento imediato ao Presidente da República, estão estabelecidas na lei 11.346, de 2006, que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). A lei foi assinada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo ex-ministro Patrus Ananias, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).
Conforme o site do conselho, o órgão é um “espaço institucional para o controle social e participação da sociedade na formulação, monitoramento e avaliação de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional, com vistas a promover a realização progressiva do Direito Humano à Alimentação Adequada”.
Compete ao Consea propor à Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional, composta por ministros e secretários especiais, as diretrizes e prioridades da polícia nacional de segurança alimentar e nutricional.
Artigos revogados
A MP 870 revogou todos os artigos da lei relacionados às competências do Consea, bom como os artigos que estabelecem a sua composição.
A medida provisória retirou do Consea a prerrogativa de convocar a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e de definir os parâmetros “de composição, organização e funcionamento” do grupo.
Pela redação antiga da lei, cabia ao Consea propor, em cima das deliberações da conferência, as diretrizes e prioridades do plano nacional de segurança alimentar e nutricional.
Também foi revogado o trecho da legislação que deixava com o Consea a tarefa de “articular, acompanhar e monitorar” a implementação do plano nacional.
O presidente ainda revogou trecho da lei com os critérios de composição do Consea, com um terço de representantes do governo e dois terços de representantes da sociedade civil.
Procurada pelo G1, a Casa Civil informou que o “Consea, bem como os demais conselhos vinculados à Presidência da República, foram extintos”.
“Foram mantidas todas as competências que haviam nos conselhos, mas agora em outros órgãos. A partir dessa forma de organização, a entrega governamental se tornará mais célere”, explicou a pasta.
A Ação da Cidadania, movimento social de combate à fome criado em 1993 pelo sociólogo Betinho, divulgou nota de pesar pela medida provisória editada por Bolsonaro.
A entidade afirma que a medida é de “surrealismo impar na história do país” e faz um apelo ao novo governo para que reconsidere as mudanças.
“O ano que o país deve voltar ao Mapa da Fome da ONU (onde mais de 5% da população se encontra em insegurança alimentar) ser o mesmo ano que o Consea é esvaziado (ou extinto, ainda não temos clareza!) é de um surrealismo impar na história do país, e ao que parece, especialmente nas questões sociais, está caminhando rumo a um retrocesso social sem precedentes.”
A Ação da Cidadania afirma que as políticas públicas originadas do Consea e das organizações participantes conseguiram retirar o país do Mapa da Fome da ONU em 2014.
Ainda segundo a entidade, o Consea teve o trabalho e resultados alcançados como objeto de estudo e referência por organismos internacionais como a própria ONU e diversos países pelo mundo.
Íntegra da nota da Ação da Cidadania
É com profundo pesar que a Ação da Cidadania recebeu a notícia em que, por meio da Medida Provisória 870, de 1º de Janeiro de 2019, o novo governo federal altera as disposições da Lei Orgânica de Segurança Alimentar (Losan), que visa assegurar o direito humano à alimentação adequada.
As alterações retiram as atribuições do Consea, órgão de assessoramento direto da Presidência da República e integrante do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), e revogam os pontos que tratam da composição do conselho, atualmente formado por 2/3 de representantes de organizações sociais da sociedade civil, que atuam de forma voluntária, sem deixar claro como será essa composição a partir de agora, se é que o conselho continuará existindo.
O Consea foi criado à época do governo Itamar Franco, sob demanda da sociedade civil, e liderado pelo grupo de organizações que formavam o movimento pela Ética na Política, tendo em vista os dados alarmantes de mais de 32 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar no país. O movimento era liderado pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, fundador do IBASE e da Ação da Cidadania Contra a Fome a Miséria e Pela Vida, entidade que tem atuado desde sua fundação em 1993 na luta por políticas públicas contra a fome e a miséria no Brasil.
Betinho foi, junto com o Bispo Dom Mauro Morelli, peça fundamental para criação do Consea, e por isso a Ação da Cidadania vem a público demonstrar sua perplexidade com esta ação já no primeiro dia do novo governo, sem diálogo nem justificativa.
É importante lembrar que as políticas públicas originadas do Consea e das organizações participantes, conseguiram retirar o país do Mapa da Fome da ONU em 2014, sendo seu trabalho e resultados objeto de estudo e referência por organismos internacionais como a própria ONU e diversos países pelo mundo.
A participação da sociedade civil no Consea é peça fundamental para que o processo de criação de políticas públicas de combate à fome e a miséria ouça, através destas organizações, a voz de quem mais sofre com a fome e a miséria, as populações mais vulneráveis.
A Ação da Cidadania é participante ativa, desde sua criação, em todas as instâncias do Consea, seja em âmbito federal, estadual ou municipal.
O ano que o país deve voltar ao Mapa da Fome da ONU (onde mais de 5% da população se encontra em insegurança alimentar) ser o mesmo ano que o Consea é esvaziado (ou extinto, ainda não temos clareza!) é de um surrealismo impar na história do país, e ao que parece, especialmente nas questões sociais, está caminhando rumo a um retrocesso social sem precedentes.
É preciso preservar os espaços de diálogo com a sociedade civil e fortalecer as políticas de combate à fome e à miséria. Em uma democracia, acima de tudo, é preciso haver diálogo com a sociedade e estar preparado para o contraditório. Fechar as portas para a participação da sociedade, a história demonstra, nos leva a governos autoritários e de confronto com seu povo. Não é isso que nos levará a um país melhor.
Por isso tudo, fazemos um apelo ao novo governo para que reconsidere estas mudanças para que possamos, através do diálogo, procurar as melhores soluções possíveis para erradicar a fome e a miséria do nosso país.
Ação da Cidadania
Comitê Nacional