Esse texto é uma resposta à matéria da Folha de S. Paulo em que, seja por falha grave de apuração, seja pela opção por fontes exclusivamente estatais, ignorância ou malícia, afirma que a “CONAFER promoveu fluxo de Yanomamis para cidade e cadastro irregular de indígenas” para benefício próprio, o que é uma inverdade, sendo que todas as nossas ações em territórios indígenas SEMPRE partem de pedidos, solicitações e demandas das próprias comunidades. Nos espanta que um jornal tão grande, de renome e reconhecimento público, tenha sido tão leviano na apuração dos fatos, sem nem ter escutado a verdade da boca de quem realmente vive e sofre com o abandono estatal: os próprios Yanomami. Tomar como verdade absoluta as notas publicadas pelo MPI e pela FUNAI mostra a fragilidade da matéria, que falha em trazer à tona a realidade da região, acreditando fielmente em narrativas criadas justamente pelos órgãos que temem perder a tutela sobre os indígenas, enfraquecendo o poder políticos dos falsos representantes que se sentaram na cadeira dos colonizadores e agem como eles. A CONAFER trabalha, e sempre trabalhará, pela autonomia dos povos indígenas.
A tentativa de caracterizar a atuação da CONAFER junto ao povo Yanomami como ilegítima, clandestina ou predatória não se sustenta diante dos fatos, dos registros públicos e, sobretudo, da realidade concreta vivida nas comunidades indígenas do médio rio Negro, do rio Padauiri, do rio Marari e da região de Barcelos, no Amazonas.
Todas as ações realizadas pela CONAFER junto aos povos Yanomami foram solicitadas pelos próprios Yanomami, por meio de suas lideranças tradicionais, tuxauas e representantes legítimos dentro dos territórios. A CONAFER não entra, não atua e não permanece em nenhum território indígena sem convite expresso, diálogo prévio e consentimento das comunidades. Essa não é uma afirmação genérica: ela é confirmada publicamente pelo apoio direto de lideranças como o Tuxaua Alípio Aprueteri Yanomami, da Aldeia Bandeira Branca, no rio Padauiri, o Tuxaua Lourenço Aprueteri Yanomami, da Xapona Mangueira, no rio Marari, pelo Batista Yanomami, Geraldo Yanomami e tantas outras lideranças, todos participantes e apoiadores das ações desenvolvidas.

As missões realizadas pela CONAFER no Amazonas, amplamente divulgadas em seu site institucional, ocorreram a partir de pedidos concretos das comunidades diante de situações extremas de fome, ausência de atendimento médico, abandono institucional e avanço de atividades ilegais. Em Barcelos e nas aldeias ribeirinhas do médio rio Negro, a CONAFER realizou mutirões sociais, entregou mais de mil cestas básicas em 22 aldeias, prestou assistência social e apoiou famílias Yanomami que estavam completamente desassistidas pelo poder público.
A formação dos Guardiões Ambientais Yanomami é outro ponto que vem sendo deliberadamente distorcido. O curso de vigilância territorial não foi imposto, nem realizado de forma indevida. Ele foi solicitado, autorizado e acompanhado pelas próprias lideranças indígenas, como parte de uma estratégia de proteção do território contra garimpo ilegal, madeireiros, pescadores e caçadores ilegais. Sabemos que o Estado não gosta muito de quem enfrenta essas atividades ilegais porque há recorrentes denúncias e investigações que apontam a participação de agentes econômicos e políticos nessas atividades, políticos e grandes empresários que usam de seu poder para manipular órgãos de proteção, como a FUNAI ou MPI, para ir contra aos interesses dos próprios indígenas, em uma defesa velada desses grandes criminosos e invasores de terras.
Ao contrário do que sugere a reportagem, a CONAFER atua de forma direta e efetiva contra o garimpo ilegal, contra madeireiros, pescadores e caçadores ilegais, fortalecendo os próprios indígenas como defensores de seus territórios. Isso incomoda porque atinge interesses profundos daqueles que detém poder e dinheiro. Quando se deixa exclusivamente “na mão do Estado”, a história mostra que nada acontece, porque há evidências históricas de conivência, omissão e interesses cruzados entre agentes públicos e atividades ilegais.

Participaram ou estavam previstas para participar do curso de Guardiões Ambientais as seguintes aldeias Yanomami:
- Aldeia Bandeira Branca
- Aldeia Paraná
- Aldeia Monopi
- Aldeia Mangueira
- Aldeia Castanha
- Aldeia Huaharu
- Aldeia Pahana
- Aldeia Katakata
- Aldeia Cachoeira do Aracá
Essas aldeias integram regiões diretamente impactadas por invasões e atividades ilegais, e a capacitação dos próprios indígenas para a vigilância territorial foi entendida pelas lideranças como uma necessidade urgente diante da omissão histórica do Estado.
O próprio Tuxaua Alípio Aprueteri Yanomami, da Aldeia Bandeira Branca, foi categórico ao afirmar publicamente sua posição e sua autonomia sobre o território. Em sua fala, ele esclarece que a autorização para a realização do curso de guardiões partiu exclusivamente dele, como liderança tradicional:
“Esse que está dando essa burocracia é sobre os guardiões, que ano passado foi feito o curso. Quem deu autorização fui eu. Não foi a Funai, não foi nada. Era minha autorização, porque eu tenho autonomia dentro da minha xapona. Eu autorizei a CONAFER a entrar para dar essa capacitação, para ter segurança, para os guardiões dentro do território. A CONAFER é minha amiga, por isso eu autorizei. Eu pedi para trazer essa capacitação para a minha equipe de guardiões. Essa foi a minha autorização.”
Essa fala desmonta completamente a narrativa de que a CONAFER teria atuado sem consentimento ou violando a autonomia indígena. Pelo contrário: o que existe é o exercício pleno da autonomia dos povos indígenas, algo que muitas vezes incomoda órgãos estatais acostumados a falar em nome dos indígenas sem ouvi-los de fato.
A presença da CONAFER nesses territórios não surgiu de forma artificial. Ela é consequência direta de um fato incômodo: uma parcela significativa da comunidade indígena nacional está profundamente descontente com a atuação da Funai e do Ministério dos Povos Indígenas. Nas aldeias, esses órgãos são frequentemente percebidos como estruturas distantes, burocráticas e simbólicas, mais preocupadas com relatórios, notas técnicas e agendas políticas do que com a sobrevivência concreta das comunidades. “Órgão pra gringo ver”, como dizem muitas lideranças por aí, que questionam a falta de atuação desses órgãos nos últimos anos, principalmente do MPI que veio como uma promessa para transformar a relação com os povos indígenas e se perdeu no caminho, em meio às burocracias e esquemas intrínsecos ao poder público. Gostaríamos de deixar claro que a crítica aqui é à atuação concreta, não à existência dos órgãos. A CONAFER defende políticas públicas fortes, quando elas funcionam.
A narrativa de que a CONAFER teria incentivado deslocamentos urbanos irresponsáveis ignora a realidade local. Os deslocamentos até Barcelos ocorreram por iniciativa e interesse dos próprios Yanomami, que buscavam documentação civil, CPF, título de eleitor e acesso a benefícios sociais historicamente negados. Esses deslocamentos já aconteciam antes da atuação da CONAFER, nós apenas auxiliamos os indígenas com uma demanda que eles mesmos tinham, como ter um lugar para ficar e se alimentar na cidade, sem passar necessidade em condições precárias ou até mesmo na rua. Tratar isso como manipulação externa é negar aos indígenas sua capacidade de decisão e reforçar uma lógica tutelar que a Constituição diz combater.

A CONAFER não pauta sua atuação pela submissão acrítica ao Estado. Não temos medo de enfrentar o Estado quando o Estado está errado. Defendemos a autonomia real dos povos indígenas, sem cabresto institucional, sem autorizações seletivas e sem controle político disfarçado de proteção.
Entramos nas comunidades para combater a fome, salvar vidas, oferecer assistência concreta e fortalecer a organização indígena. E entraríamos novamente mil vezes, sempre que convidados, enquanto houver indígenas passando fome, adoecendo sem atendimento ou morrendo em territórios abandonados pelo poder público.
Não é coincidência que tentem criminalizar a CONAFER. O que existe é medo da transformação social que pode ocorrer quando os povos indígenas, os verdadeiros donos dessas terras, se fortalecem, se organizam e exercem sua autonomia de forma plena. Criminalizar quem atua ao lado deles é uma estratégia antiga para manter tudo como está. A manutenção do status quo só é benéfica para quem está no topo da pirâmide social.
A CONAFER seguirá fazendo o que sempre fez: ouvindo as lideranças, respeitando a autonomia indígena, atuando onde o Estado falha e defendendo a vida, a dignidade e o direito de existir dos povos Yanomami. Isso não será apagado por relatórios técnicos produzidos longe das aldeias nem por narrativas que ignoram deliberadamente a voz de quem vive no território.
Ações e trabalhos da CONAFER para os povos da região
A atuação da CONAFER no território Yanomami se materializa em ações concretas e contínuas de enfrentamento à fome, ao abandono institucional e à violação de direitos, começando pelo atendimento direto a indígenas que chegam às cidades em condições extremamente precárias, garantindo alimentação diária com café da manhã, almoço e jantar — uma responsabilidade que deveria ser assumida pela Funai, mas que falhou reiteradamente. A CONAFER também forneceu barcos equipados com motores 50hp para apoiar atividades comunitárias, realizou a entrega de milhares de cestas básicas, merenda escolar, brinquedos para crianças e centenas de kits de higiene em diversas aldeias, além de desenvolver projetos de reforço escolar com foco na valorização da tradição local e distribuição de uniformes para crianças Yanomami.
No campo da geração de renda e do fortalecimento comunitário, a CONAFER promoveu cursos de meliponicultura como alternativa econômica sustentável e atuou para mitigar a insegurança alimentar agravada durante a pandemia de Covid-19, período em que muitas comunidades Yanomami tiveram sua produção agrícola profundamente afetada pela dificuldade de acesso aos territórios e à obtenção de insumos. Diante desse cenário, a entidade levou recursos materiais até regiões isoladas e de difícil acesso, apoiando comunidades ribeirinhas que produzem farinha, banana, tapioca, beiju, açaí, castanha, pescados e artesanatos da agricultura familiar. Somam-se a essas ações a articulação e execução do atendimento do barco do INSS nas aldeias, garantindo acesso a direitos previdenciários historicamente negados.
Destaca-se ainda a construção do Posto de Saúde da Aldeia Águas Vivas, no Rio Preto, próxima ao município de Santa Isabel do Rio Negro, uma obra realizada em condições extremamente adversas: em 30 de setembro de 2023, uma equipe da CONAFER partiu de Barcelos transportando materiais de construção por via fluvial, enfrentando a estiagem severa no Amazonas, três cachoeiras e sucessivos desembarques manuais de carga, em uma viagem que durou nove dias, com apoio direto dos Yanomami na retirada de areia e no transporte dos materiais. A obra iniciou-se em 8 de outubro e foi concluída em 27 de outubro, com a entrega das chaves do posto de saúde à liderança da aldeia. Complementarmente, a CONAFER realizou a formação de 67 Guardiões Ambientais Yanomami, organizados em brigadas comunitárias de incêndio e vigilantes territoriais, capacitados para monitorar e denunciar invasões, garimpo ilegal, exploração madeireira, caça e pesca predatórias, reforçando a proteção da vida e do território de forma efetiva e solicitada pelas próprias comunidades.




































