A Agricultura 4.0 é um conjunto de tecnologias digitais integradas e conectadas através de softwares, sistemas e equipamentos. É ela quem permite que produtores coloquem a agricultura de precisão em prática. Essa integração é capaz de otimizar a produção agrícola em todas as suas etapas, desde o plantio até a colheita. Mas a próxima revolução desta indústria pode estar nos lixos vegetais, como folhas, restos de madeira, cortiça e carvão usados. Estamos falando do grafeno induzido por laser verde, o gLIG. Por ser leve, flexível, quase transparente, ele é um elemento excelente condutor de calor e eletricidade, e cerca de 200 vezes mais resistente que o aço. O grafeno é considerado um material que pode provocar uma revolução tecnológica na indústria eletrônica 

Tecnologia a laser abre caminho para o grafeno verde

  • Um estudo de pesquisadores brasileiros e portugueses apresenta os desafios e as potencialidades do grafeno induzido por laser verde (gLIG).
  • A gLIG pode ser extraída de várias fontes naturais de carbono, como folhas, restos de madeira, cortiça e carvão.
  • Descobertas abrem caminho para a geração de eletrônicos ecológicos e de baixo custo.
  • A tecnologia permitirá o desenvolvimento de materiais eletrônicos vestíveis e até comestíveis.
  • A Advance promoverá a mitigação de um dos maiores desafios atuais da sustentabilidade ambiental: o lixo eletrônico.

Grafeno e gLIG

O material mais fino do mundo, o grafeno é produzido a partir do grafite; é um cristal bidimensional formado por ligações entre átomos de carbono, dispostos em estruturas hexagonais semelhantes a um favo de mel.

Já o gLIG é um material emergente e altamente sustentável, obtido por uma técnica chamada escrita direta a laser (LDW) – fabricação tridimensional (3D) a partir de substratos naturais que oferece versatilidade geométrica significativa que atinge escalas de comprimento micrométricas.

Essa nova tecnologia é desenvolvida em temperatura ambiente, sem nenhum tipo de reagente, enquanto o grafeno convencional é produzido em altas temperaturas, em torno de mil graus centígrados, utilizando equipamentos muito caros e complexos. A eliminação de tratamentos químicos garante alta eficiência de conversão, minimizando tempo e consumo de energia no processo de gravação.

A escrita direta a laser (LDW), como é conhecida, é um método de abordagem sem máscara, sem catalisador, atóxico, controlável e sem contato, que permite o processamento rápido, direto e eficiente de estruturas complexas. Essa técnica se assemelha a um tipo de ataque químico baseado em reações fototérmicas, transformando a superfície gravada em um material de interesse tecnológico.

Entre os desafios na produção do grafeno e suas aplicações, está a exploração de matéria-prima a partir de fontes renováveis. Isso pode ser feito por meio da tecnologia de grafeno induzido por laser verde (gLIG), que foi o foco de um estudo publicado na revista Applied Physics Reviews , de autoria de cientistas brasileiros e portugueses.

Esta tecnologia abre caminho para a fabricação de dispositivos simples, sustentáveis ​​e de baixo custo, baseados em fontes de carbono abundantes e renováveis ​​como madeira, folhas, cortiça, casca e celulose. Assim, contribuirá para a redução do lixo eletrônico, também conhecido como lixo computacional ou lixo eletrônico. Esses termos são usados ​​para designar dispositivos que são alimentados por eletricidade ou baterias.

O grafeno induzido por laser (LIG) abre a possibilidade de produção simples, econômica e escalável de componentes tecnológicos”, relata o engenheiro de materiais Pedro Ivo Cunha Claro, um dos autores do artigo escrito durante sua pós-graduação na Universidade de São Carlos ( UFSCar) e a Universidade NOVA de Lisboa (UNL). O pesquisador lembra que nos últimos anos tem havido pesquisas cada vez mais extensas sobre o grafeno induzido por laser verde (gLIG) para integração em diversas aplicações eletrônicas, como supercapacitores, sensores, eletrocatalisadores e nanogeradores triboelétricos.

As técnicas de processamento assistido por laser surgiram como ferramentas poderosas para uma infinidade de aplicações, desde o processamento de materiais até a fabricação de dispositivos”, afirma Claro, que atualmente é analista de Desenvolvimento Tecnológico do Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais ( CNPEM ) em  Campinas , SP .

Segundo ele, diversos sistemas baseados em gLIG para armazenamento de energia, eletrocatálise, tratamento de água e sensores já foram relatados na literatura. Além disso, a gLIG foi proposta para formular corantes ou para ser incorporada em matrizes poliméricas, a fim de expandir ainda mais seu uso para substratos não baseados em carbono ou aplicações onde a Lig original não pode ser usada diretamente.

“Suas propriedades mecânicas e físico-químicas, como alta capacidade de resistência mecânica e condutividade elétrica, o tornam um material com enorme potencial de aplicabilidade tecnológica em diversas áreas”, afirma o engenheiro.

Menos lixo eletrônico

O gLIG pode desencadear uma revolução na forma como os circuitos integrados e componentes eletrônicos são produzidos. Com isso, a tecnologia poderá reduzir o lixo eletrônico, que prejudica tanto o meio ambiente quanto a saúde humana por conter aditivos tóxicos ou substâncias perigosas como o mercúrio. O próprio processo de obtenção do gLIG é mais limpo, pois não utiliza reagentes tóxicos ou métodos tradicionais.

Em 2019, o lixo eletrônico atingiu um recorde de 53,6 milhões de toneladas métricas globalmente, um aumento de 21% em cinco anos, de acordo com a terceira edição do Global E-waste Monitor 2020 das Nações Unidas. O Brasil lidera a geração de lixo eletrônico entre as nações de língua portuguesa com 2.141 toneladas.

Além de Pedro Claro, o paper é da autoria dos   pesquisadores da Embrapa Instrumentação, Luiz Henrique Capparelli Mattoso e José Manoel Marconcini , e da professora Elvira Maria Fortunato, da Universidade Nova de Lisboa (UNL), atual ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Portugal Mattoso, que assessorou a Claro no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA) da Embrapa, em São Carlos, SP, diz que as recentes descobertas abrem caminho para a elaboração de eletrônicos verdes escaláveis ​​e de baixo custo. “É possível aplicar gLIG em diferentes substratos, visando o desenvolvimento de materiais eletrônicos comestíveis e vestíveis. A gLIG pode ser extraída de restos de madeira, folhas, cortiça e carvão, e outras fontes naturais, permitindo o desenvolvimento de plataformas flexíveis e sustentáveis ​​como alternativa às tecnologias convencionais”, afirma o investigador, especialista em nanotecnologia.

“Conseguimos usar a tecnologia LIG para projetar circuitos à base de grafeno convertendo cadeias de carbono associadas a qualquer biopolímero ou material celulósico, o que se traduz em uma grande melhoria nos recursos necessários para desenvolver bioeletrônica sustentável que contribui para o bem-estar dos cidadãos e conforto”, relata o coordenador do Centro de Pesquisa de Materiais da UNL (Cenimat), Rodrigo Martins, que também participou do estudo.

A próxima revolução desta indústria pode estar nos lixos vegetais, como folhas, restos de madeira, cortiça e carvão usados

Perspectivas

Desde a sua descoberta em 2004, o grafeno e nanomateriais bidimensionais (2D) similares têm sido intensamente estudados e despertam muito interesse devido às suas propriedades físico-químicas promissoras, pois alguns produtos já estão disponíveis comercialmente e têm mostrado desempenhos promissores em comparação com outras fontes verdes.

A União Europeia criou um consórcio, o Graphene Flagship, composto por 150 parceiros com um orçamento total de 1 bilhão de euros. O projeto abrange vários campos, desde a pesquisa básica até o comércio de grafeno a longo prazo.

Esforços semelhantes, visando desvendar e explorar plenamente as propriedades do grafeno, estão sendo realizados em todo o mundo, inclusive no Brasil, grande produtor de grafite e detentor de uma das maiores reservas mundiais do mineral. Até o momento, o grafeno tem sido usado com sucesso em armazenamento de energia, aplicações ambientais e biomédicas, entre outros.

Para Mattoso, embora haja muitos desafios a serem superados, há oportunidades para que diferentes métodos de processamento, materiais e produtos entrem no mercado, pois o grafeno é um material versátil e pode ser combinado com outros elementos para produzir diferentes materiais com propriedades superiores. Além de todas essas vantagens, a gLIG também pode contribuir para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

Autores

Os autores do artigo são Pedro Claro (UFSCar); Tomás Pinheiro, Sara L. Silvestre, Ana C. Marques, João Coelho, Rodrigo Martins Elvira Fortunato (Universidade Nova de Lisboa); Luiz HC Mattoso e José M. Marconcini (Embrapa).

O estudo foi parcialmente financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e pelo Sistema Nacional de Laboratórios de Nanotecnologia (SisNano). O Projeto contou com o apoio financeiro do Conselho Europeu de Investigação (ERC) e da Fundação Nacional para a Ciência e Tecnologia (FCT).

Com informações da Embrapa.

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