FONTE: GauchaZh

Digitalização exige interconexão de informações geradas no campo por inúmeros equipamentos

Produtor de grãos em Cruz Alta, no noroeste do Rio Grande do Sul, Maurício De Bortoli trabalha com sete marcas de máquinas e implementos agrícolas na lavoura de quase 9 mil hectares. Em Capão Bonito, na região sudoeste de São Paulo, o agricultor Sidney Fujivara cultiva 3,2 mil hectares com a ajuda de equipamentos de cinco fabricantes. No Sul e no Sudeste, De Bortoli e Fujivara enfrentam desafio comum a produtores de todo o país diante do avanço da digitalização: conectar em plataformas comuns informações geradas por inúmeras máquinas, sensores e softwares.

Embora já existam sistemas para integrar bancos de dados que usam linguagens de programação distintos – a chamada Interface de Programação de Aplicativos (do inglês Application Programming Interface – API), na prática muitos produtores se sentem perdidos no meio de sistemas distintos.
— Muitos dados são gerados em formatos diferentes, o que dificulta a comparação – relata De Bortoli, gerente-técnico da Sementes Aurora.
No total, a propriedade soma quase 50 máquinas e equipamentos — entre tratores, colheitadeiras, pulverizadores, plantadeiras e aplicadores de fertilizantes. A escolha por diferentes máquinas, em vez de uma marca única e com sistemas compatíveis, se dá pela oportunidade de negócio e pela opção de investir na melhor tecnologia disponível,

conforme o equipamento.
— O mercado percebeu essa lacuna e passou a oferecer programas específicos para gerenciamento de dados. Mesmo assim, tem muitas informações que precisamos analisar separadamente – relata De Bortoli, que durante a 26ª Agrishow, em Ribeirão Preto (SP), buscou máquinas que tenham a opção de conectividade.

O mesmo dilema é vivido pelo produtor Fujivara no interior de São Paulo. Com equipamentos de marcas distintas operando nas lavouras de grãos, o produtor se vê diante de plataformas diferentes de geração de indicadores – algumas incompatíveis.
— Sou um fã da agricultura digital. Mas me sinto perdido em meio a soluções tão variadas. Diante de tanta informação em torno da agricultura 4.0, algumas caem em descrédito —avalia Fujivara.

Na tentativa de simplificar a interpretação de milhares de parâmetros gerados diariamente no campo, a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq) lançou durante a Agrishow o Banco de Dados Colaborativo do Agricultor. A iniciativa é encabeçada inicialmente por sete empresas brasileiras, que pretendem sensibilizar fabricantes multinacionais a aderirem ao projeto.
— Hoje, o que vemos é cada empresa querendo que o produtor gere seus dados na sua plataforma. Mas o dado é do produtor, é ele quem planta, pulveriza e colhe. Por isso decidimos criar um sistema independente — explica João Alfredo Delgado, diretor-executivo de Tecnologia da Abimaq, entidade que garantirá a segurança do modelo compartilhado.
O sistema, com dados parametrizados, foi desenvolvido pela Faculdade de Tecnologia do Estado (Fatec) Shunji Nishimura, em Pompeia (SP). O primeiro ano do projeto será de adesão de empresas e agricultores, que precisam autorizar o compartilhamento.
— Somente o produtor terá a chave de acesso. É ele que decidirá com quem dividir as informações — explica Cristiano Pontelli, gerente de negócios de agricultura de precisão da Jacto, uma das participantes.

Indicadores agronômicos são prioridade das fabricantes

As indústrias poderão compartilhar parte ou totalidade do que é gerado para armazenamento nesse banco.
— A prioridade são dados agronômicos, comuns a todas as empresas. Com isso, informações antes soltas serão visualizadas de maneira unificada — exemplifica Cinthia Dal Vesco, gerente de marketing da Stara, participante da iniciativa.
Durante a feira, pelo menos outras 10 empresas manifestaram interesse em integrar o projeto. Uma delas é a americana Trimble, empresa de tecnologia de agricultura de precisão, que já tem acordos com diversas fabricantes de máquinas para compartilhamento.

Banco de Dados Colaborativo do Agricultor
  • É uma plataforma multimarcas criada com o propósito de integrar informações agronômicas, como rendimento por talhões, gerados por equipamentos, sensores e softwares de diferentes fabricantes.
  • A liberação para compartilhamento de informações para o sistema depende da adesão das empresas ao projeto e da autorização do produtor.
  • Os dados unificados na plataforma são do agricultor, que tem autonomia para autorizar o acesso.
  • A Abimaq será responsável pelo sistema, garantindo a segurança das informações geradas.

Na mesma feira onde indústrias brasileiras lançaram o banco de dados colaborativo do agricultor – a Agrishow –, uma ferramenta europeia foi apresentada. O Agrirouter, criado há cinco anos, reúne 14 fabricantes de máquinas agrícolas, além de outros fornecedores de software e hardware. O conceito é praticamente o mesmo do lançado no Brasil: uma plataforma universal multimarcas.
— Na prática, é o compartilhamento de informações entre máquinas e os aplicativos usados na lavoura, para que se tornem simples e amigáveis para interpretação do produtor —explicou o francês Christian Adler, gerente de eletrônica e soluções digitais do Grupo Kuhn, participante do projeto no continente europeu.

Segundo o especialista, o Agrirouter também reduz o esforço administrativo das propriedades, além de aumentar a confiabilidade nas operações.
— A plataforma universal resolve um problema central na agricultura digital moderna — acrescenta Adler.
Um dos vice-presidentes da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Alexandre Bernardes afirma que a tendência mundial é de plataformas cada vez mais conectadas, especialmente em equipamentos multimarcas:
— As barreiras tendem a caírem, por uma necessidade do próprio produtor — disse Bernardes, prevendo que o modelo também deverá prosperar no Brasil, a partir da adesão de novas empresas ao projeto da Abimaq.
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