da Redação
Plenário da corte votou por unanimidade em favor da liminar do ministro Luís Roberto Barroso, que tornam obrigatórias ações do governo para evitar novas mortes em territórios indígenas
A perda do cacique Aritana Yawalapiti, um ser humano extraordinário que lutava por sua cultura e pela preservação da identidade do seu povo, e que deixou a materialidade aos 76 anos para transformar-se em ancestralidade yawalapiti, trouxe muita tristeza em toda a comunidade indígena do Xingu. São muitas vítimas já dentro das aldeias indígenas. O grande líder Aritana faz parte agora de um triste quadro de caciques, pajés e guerreiros infectados e mortos nesta pandemia.
Todos sabem da vulnerabilidade dos povos originários, inúmeras vezes vítimas de doenças infecciosas ao longo da história de contato com os colonizadores. Os números são trágicos e crescem exponencialmente. A cada dia novas infecções e óbitos aumentam ainda mais o sofrimento nas aldeias. Mas hoje, o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição, pôde dar um novo rumo nesta crise sanitária nos territórios indígenas, e que já se transforma em crise humanitária.
No dia 8 de julho passado, o presidente da República sancionou a Lei 14.021 de ajuda emergencial aos povos originários e tradicionais, mas vetou água potável, compra de respiradores e máquinas de oxigenação sanguínea, acesso ao auxílio emergencial e a criação de um Plano Safra específico para os povos indígenas e comunidades tradicionais no enfrentamento da Covid-19.
A mídia internacional condenou perplexa os vetos à Lei que deveria cuidar dos indígenas e quilombolas de forma urgente. Fato que não ficou restrito às discussões nas redes sociais, pois o ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso , após a publicação da Lei 14.021 com os vetos do presidente, entrou com medida cautelar determinando que o governo federal adotasse medidas efetivas para combater a Covid-19 entre na população indígena. Também solicitou o planejamento, com a participação das comunidades, de estratégias para conter as ações de invasores, de instalação de barreiras sanitárias e o acesso de todos os indígenas ao Subsistema de Saúde.
O que estava em julgamento nesta tarde era a defesa urgente dos povos originários brasileiros
Com o julgamento favorável ao processo de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ADPF 709, espera-se do governo a adoção de medidas urgentes para proteger as populações indígenas da pandemia de Covid-19. Em seu voto antes na segunda-feira, dia 3, o relator ministro Barroso, além de referendar a liminar que já havia dado durante o recesso, determinou a elaboração de plano para enfrentamento e monitoramento da doença entre os povos indígenas.
O presidente do Supremo também estabeleceu que a sala de situação tenha a participação de representantes dos indígenas, Ministério Público e Defensoria, além de indicar um representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e um observador de seu gabinete para acompanhar as reuniões sobre a Covid-19 nas comunidades indígenas.
A omissão do poder público no combate à pandemia da Covid-19 implicou em alto risco de contágio e de extermínio de diversos povos indígenas. Uma discriminação incompatível com os direitos à saúde, à isonomia e à diferença cultural e que “viola gravemente o dever estatal de proteger e promover os direitos fundamentais dos povos indígenas, notadamente à sua vida e saúde” – como cita o texto da ADPF.
A manutenção da liminar foi fundamental para evitar uma catástrofe sanitária e impedir mais um genocídio dos povos indígenas do Brasil.
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Em junho, a CONAFER entrou com Ação Civil Pública contra União e FUNAI
A Confederação protocolou uma Ação Civil Pública há 2 meses pedindo a condenação da União para que a FUNAI e SESAI atuem com urgência contra a Covid-19 nos territórios indígenas, mas o pedido foi negado pela 6ª Vara Federal do Distrito Federal. A CONAFER apelou recentemente contra a sentença judicial que alegou “ativismo judiciário” com pedido na 2ª instância.
A CONAFER requer o reconhecimento de nulidade da sentença apelada por vício de fundamentação com a sua cassação, já que essa não analisa os elementos essenciais ao adequado julgamento da demanda, e também pede o provimento do recurso para dar prosseguimento à Ação Civil Pública.
A Confederação não vai medir esforços para exigir que os órgãos competentes atuem com a urgência pela gravidade da situação. O recurso de apelação foi remetido ao TRF-1, Tribunal Federal da Primeira Região, e tem por finalidade a cassação da sentença expedida para que a ação retorne à sua origem e seja devidamente processada. E em caráter emergencial.
O descaso do governo brasileiro nestes meses de pandemia não apresentou nenhuma estratégia para proteger os territórios, desestruturou mais ainda os órgãos de fiscalização e não implementou políticas para que os indígenas permanecessem nas aldeias com segurança alimentar.
O que está acontecendo com os povos originários do Brasil não pode ser ignorado. As aldeias foram fortemente atingidas pela pandemia já vitimou 623 indígenas e outros 21.646 foram contaminados. A doença chegou a 146 povos em vários estados. Já são mais de 40 lideranças mortas, homens e mulheres que carregam a ancestralidade e os valores passados de geração para geração. O fato extrapola a dor de todos os parentes, para tornar-se um grande lamento para toda a humanidade.
A CONAFER espera que o governo cumpra as determinações do STF para atuar de forma urgente e responsável na proteção de indígenas, quilombolas e povos tradicionais, como foi pedido pela Confederação em sua Ação Civil Pública negada pela justiça.