Foto: Fellipe Abreu

Neste mês de dezembro, a revista Science publicou o artigo “Indigenização da ciência de conservação para uma Amazônia sustentável”, que destaca a importância dos povos indígenas na proteção da Amazônia e como seus conhecimentos tradicionais ajudam a preservar a biodiversidade. A ideia é que a ciência ambiental incorpore esses saberes, criando soluções mais eficazes contra o desmatamento. A pesquisa sugere três princípios indígenas para a conservação: a ideia de que seres humanos e natureza estão profundamente conectados, que existem práticas necessárias para manter essa relação e que ela é cíclica. A exemplo disso, práticas antigas estão sendo valorizadas, como o uso da “terra-preta”, um solo fértil criado pelos indígenas para a agricultura

Os saberes indígenas são muito importantes para a conservação da natureza porque ensinam formas de viver em harmonia com o meio ambiente. Esses conhecimentos tradicionais, transmitidos por gerações, envolvem práticas sustentáveis de manejo dos recursos naturais, como o uso racional de plantas, o controle de queimadas e a preservação da biodiversidade. Para os indígenas, a natureza é algo sagrado e todos os seres estão conectados. Usando esses conhecimentos, é possível preservar florestas, rios e a biodiversidade de forma sustentável, ajudando a proteger o planeta contra problemas como o desmatamento e as mudanças climáticas.

Foto: Bruno Kelly

Um exemplo de prática sustentável é a terra preta, um tipo de solo fértil e escuro, rico em carbono e nutrientes, que é encontrado principalmente na Amazônia. Esse solo é resultado de práticas antigas de manejo agrícola dos povos indígenas, que criaram uma espécie de “composto” a partir de restos de plantas, carvão vegetal, ossos e outros materiais orgânicos. Esse processo, conhecido como “terra preta de índio”, melhora a qualidade do solo, tornando-o mais produtivo e capaz de reter água e nutrientes por mais tempo. A criação e uso dessas terras demonstram a sabedoria dos povos indígenas em cultivar e preservar o solo sem prejudicar o meio ambiente, contribuindo para o equilíbrio da biodiversidade e mostrando que a agricultura pode ser realizada de forma harmônica com a natureza.

O artigo “Indigenização da ciência de conservação para uma Amazônia sustentável” reconhece os saberes originários como parte fundamental para a preservação das florestas. A pesquisa defende que os indígenas são especialistas em biodiversidade, uma vez que além de terem criado práticas sustentáveis como a terra preta, também realizam o manejo de sistemas agroflorestais e a proteção de 27% da Amazônia. Dessa forma, os conhecimentos indígenas devem ser integrados ao processo científico, criando estratégias mais eficazes e alinhadas à realidade da Amazônia.

Em 2023, o Brasil perdeu cerca de 10.000 km² de floresta amazônica, o que equivale a mais de 1 campo de futebol por minuto. O desmatamento na região aumentou 21% em relação ao ano anterior, agravando a crise ambiental e climática – Foto: Alez Pazuello/Secom

Por outro lado, o artigo também admite que a ciência ambiental, historicamente, ignorou ou se apropriou dos saberes indígenas e reconhece que é muito importante romper com esse padrão e estabelecer um diálogo com os especialistas indígenas. O objetivo é incorporar princípios milenares dos povos originários nas práticas científicas de forma ética e colaborativa, valorizando práticas ancestrais. Enquanto a ciência ocidental via a conservação como o isolamento da floresta e dos seres humanos, na cultura indígena existe uma relação de respeito e negociação com a natureza. Segundo estudiosos, a solução para combater a degradação da floresta está no reconhecimento desses saberes ancestrais pela ciência, o que possibilitaria a construção de abordagens mais plurais e eficazes.

Vista aérea da aldeia do Demini da floresta amazônica, no alto rio Demene, na TI Yanomami, divisa dos estados de Roraima e Amazonas – Foto: Edson Sato

A publicação também enfatiza que as soluções de conservação que desconsideram os saberes indígenas, muitas vezes, não geram resultados sustentáveis e desrespeitam os direitos da natureza. Os autores sugerem a incorporação de três princípios indígenas na ciência ambiental, com o objetivo de tornar as pesquisas mais integradas e eficazes: 1) o reconhecimento de uma rede cosmopolítica que envolve relações de parentesco, comunicação, negociação e intercâmbio entre humanos e natureza; 2) a compreensão de que existem práticas e restrições necessárias para manter essa rede em funcionamento; e 3) a afirmação de que essa rede e suas atividades são cíclicas. A adoção desses princípios pode ajudar a afastar a ciência de visões antropocêntricas, que colocam o ser humano no centro do mundo, e aproximá-la de abordagens mais alinhadas à conservação sustentável.

Foto: Fellipe Abreu

A Secretaria Nacional Indígena da CONAFER promove, de forma permanente, a preservação ambiental e a proteção dos direitos indígenas, por meio de ações de educação, combate às queimadas florestais e promoção de cursos sobre direitos humanos nas aldeias de todo o país. Além disso, a Confederação apoia a agricultura familiar nas aldeias e defende o marco ancestral contra a inconstitucionalidade do marco temporal, pois acredita que a proteção dos territórios indígenas é uma forma de preservar a biodiversidade contra a exploração. Os dados do artigo “Indigenização da ciência de conservação para uma Amazônia sustentável” reforçam ainda mais a importância dos saberes indígenas para a ciência e para a conservação do meio ambiente.

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