O biocarvão é um material de origem orgânica, um tipo de carvão vegetal produzido a partir de um processo controlado, a pirólise, que é a transformação por aquecimento de uma mistura, ou de um composto orgânico, em outras substâncias. O biocarvão como fonte de energia limpa promove o crescimento das plantas e reduz a severidade da murcha de Fusarium no tomate. Em síntese, o biocarvão aumenta a fertilidade do solo e sequestra o carbono

Uma pesquisa desenvolvida pela Embrapa Rondônia, em parceria com a Universidade Federal Rural de Pernambuco ( UFRPE ), o Instituto Federal de Rondônia (IFRO ), no Brasil, e a Universidade de Santiago de Compostela ( USC), Espanha, resultou em uma inovação que simplifica e acelera a obtenção do biocarvão. Esse material tem mostrado potencial para produzir fertilizantes organominerais (obtidos a partir de matérias-primas de origem animal e vegetal), que podem ajudar o Brasil a reduzir sua dependência de produtos importados. A técnica reduz de três para uma as etapas de produção do biocarvão, pois seu processo de combustão já incorpora partículas de solo, diferentemente das convencionais, em que o carvão produzido precisa primeiro ser ativado e depois misturado ao solo.

Já outro estudo realizado na Embrapa Meio Ambiente com biochar – finos de carvão (material com diâmetro inferior a 9,5mm resultante da produção de carvão vegetal) – mostrou que seu uso no solo aumenta a biomassa microbiana, promove o crescimento das plantas e reduz a severidade da murcha de Fusarium no tomate, além de mitigar as mudanças climáticas. É uma tecnologia limpa que contribui para a sustentabilidade da produção agrícola e está alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. 

O pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, Cristiano Andrade, afirma que o uso do biocarvão é uma alternativa para mitigar as emissões antrópicas de gases de efeito estufa, que incluem os do setor agrícola, responsáveis ​​por cerca de 30% das emissões nacionais. O seu potencial para mitigar as emissões reside no sequestro do dióxido de carbono que as plantas exalam nos campos através da fotossíntese durante o seu desenvolvimento, e na sua posterior estabilização em carvão quando a biomassa é pirolisada a altas temperaturas (normalmente entre 350ºC e 750ºC), na ausência ou baixa concentração de oxigênio. Uma vez aplicado o material no solo, ele é muito estável e permanecerá nos sistemas por séculos, promovendo melhorias relacionadas à fertilidade do solo, física e microbiologia.

Encontrar soluções para reduzir a dependência brasileira de fertilizantes importados hoje é uma das prioridades da pesquisa agrícola

No Brasil, maior produtor mundial de carvão vegetal, os finos de carvão são gerados em grandes quantidades devido à sua alta fragmentação durante seus processos de fabricação, manuseio e transporte. Assim, a produção de carvão vegetal gera cerca de 25% a 30% dos finos e apenas 20% são reaproveitados na indústria de ferro-gusa. 

Embora outros tipos de biomassa de origem animal ou vegetal também possam ser utilizados para a produção de biocarvão, o fato de já haver finos de carvão vegetal é uma vantagem, pois seu valor para o setor siderúrgico é relativamente baixo e há possibilidade de aplicação direta em solo ou na composição de fertilizantes organominerais. 

O uso do biocarvão é uma alternativa para mitigar as emissões antrópicas de gases de efeito estufa

Segundo Lucas Silva, autor do estudo e bolsista da Embrapa Meio Ambiente, a severidade da murcha de Fusarium e a atividade microbiana no solo foram inversamente proporcionais às concentrações de biocarvão incorporadas ao solo. À medida que as concentrações foram aumentadas, não apenas a massa fresca e seca da raiz e da parte aérea cresceu, mas também o diâmetro do caule. Além disso, houve efeito na redução da germinação de Fusarium microconidia. 

“A redução na severidade da murcha de Fusarium do tomateiro com concentrações crescentes de biochar no solo pode ser explicada pela indução de resistência sistêmica. Na literatura científica, há relatos de que a adição de biochar induz resistência ao mofo cinzento e ao oídio tanto em pimentão quanto em tomateiro”, afirma Silva.

Segundo o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, Wagner Bettiol, as plantas podem recrutar ativamente microrganismos benéficos em suas rizosferas para combater o ataque de fitopatógenos. Murcha de Fusarium , causada por três raças de Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici , é uma das doenças economicamente mais importantes e difundidas do tomateiro cultivado e sua diversidade é observada em cepas patogênicas. 

O aumento no carbono da biomassa microbiana mostrou que a biomassa microbiana aumenta no solo próximo às partículas de biocarvão. Além disso, maiores taxas de crescimento de comunidades microbianas foram observadas em camadas de solo enriquecidas com carvão vegetal, o que indica que os microrganismos são capazes de utilizar frações de carbono do biocarvão para seu desenvolvimento.

A supressão de doenças de plantas causadas por patógenos de solo pode estar relacionada à capacidade de adsorção do biochar para reduzir compostos (exsudatos radiculares), o que de outra forma facilitaria a detecção de patógenos e infecção nas raízes, uma vez que os exsudados radiculares agem como quimioatrativos para uma série de fitopatógenos e estimulam germinação de esporos. 

“Em experimentos em estufa, o carvão ativado adsorve compostos alelopáticos produzidos pelas plantas. Portanto, é razoável supor que as interferências do biocarvão incorporado ao solo ocorram entre raízes e fitopatógenos de solo”, afirma Andrade.

“Portanto, não apenas a abundância, mas também o comportamento de crescimento das raízes pode mudar em resposta à presença de biochar. Com impactos positivos na fertilidade do solo e nos atributos físicos e biológicos, as raízes podem ter melhor desenvolvimento e vigor, contribuindo para a obtenção de produtividades competitivas. Nosso foco em pesquisas futuras é avaliar um possível sinergismo entre os agentes de biocontrole e o biocarvão incorporado ao solo”, diz Andrade.

Com informações da Embrapa Rondônia e Embrapa Meio Ambiente.

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