A Câmara dos Deputados aprovou, nesta noite de quinta-feira (21), o aguardado projeto que regulamenta o mercado de carbono no Brasil. A proposta, que agora seguirá para análise do Senado, integra a “agenda verde” da Câmara, focada em questões ambientais e alinhada com os esforços globais para enfrentar as mudanças climáticas. Representantes da CONAFER estiveram presentes acompanhando a votação.
O texto aprovado unifica diversas propostas sobre o tema, consolidando a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Este sistema busca compensar a emissão de gases poluentes, premiando empresas e países que reduzem suas emissões e penalizando aqueles que as aumentam.
O mercado de crédito de carbono funciona como um mecanismo em que empresas e governos podem negociar créditos equivalentes à quantidade de carbono que deixam de emitir na atmosfera. O relator do texto na Câmara, deputado Aliel Machado, esclareceu que tentou preservar ao máximo o texto do Senado, mas ressaltou a necessidade de aperfeiçoamentos em algumas definições, especialmente relacionadas aos direitos de propriedade e usufruto dos titulares de créditos de carbono.
Dentre os pontos mais debatidos durante a tramitação do projeto, destaca-se a atuação dos estados no mercado de carbono. O texto do Senado permitia que os estados tivessem seus próprios mercados, chamados de jurisdicionais, abrangendo áreas privadas. No entanto, a Câmara, inicialmente, propôs restrições, limitando a venda de créditos de carbono gerados em terras públicas. Após negociações com governadores, a proposta foi ajustada para manter a autonomia dos estados na gestão desses créditos.
SBCE: Como Funcionará o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões
O projeto cria o SBCE, composto por um órgão superior deliberativo, um comitê técnico consultivo permanente e um órgão gestor. As regras de funcionamento desses órgãos serão definidas por meio de ato do poder executivo federal.
O órgão superior deliberativo será composto por representantes de diversos ministérios, da Câmara, do Senado, dos estados e dos municípios. Já o comitê técnico consultivo contará com representantes de entidades setoriais, da União e dos Estados.
Empresas que emitem mais de 10 mil toneladas de gases de efeito estufa por ano serão submetidas ao SBCE. Elas deverão apresentar um plano de monitoramento das emissões, informar ações para remoção dos gases da atmosfera e enviar relatórios periódicos quando as emissões ultrapassarem 25 mil toneladas ao ano.
A Exclusão da Agricultura e Pecuária
Um dos aspectos mais controversos do projeto foi a decisão de deixar as atividades agrícolas e pecuárias fora da regulamentação do mercado de carbono. Em novembro, o relator Aliel Machado chegou a propor a inclusão do agronegócio, mas a versão final aprovada pela Câmara manteve a exclusão.
O setor agropecuário é responsável por 25% das emissões no Brasil, e a exclusão gerou debates acalorados no Congresso. O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a inclusão, argumentando que seria crucial para a meta do governo alcançar a neutralidade em CO2 até 2050. No entanto, a forte oposição da bancada ruralista e do setor agropecuário prevaleceu.
A exclusão da agricultura e pecuária do mercado regulado de carbono representa um desafio para os esforços de descarbonização do país. Enquanto o mercado impacta indústrias como siderurgia, alumínio, setor de cimento e indústria química, o agronegócio permanecerá no mercado voluntário de carbono.
A participação do setor agropecuário permitiria aos produtores negociar créditos de carbono e usufruir de benefícios, impulsionando tanto o setor como o mercado. No entanto, a bancada ruralista argumentou que as novas regras introduziram incertezas sobre como seria calculado o impacto ambiental das emissões relacionadas à agropecuária.
Além de não precisar seguir as regras do mercado regulado, a bancada da agropecuária conseguiu algumas alterações na proposta para que o setor participe voluntariamente da compra e venda de créditos. Dentre as modificações no projeto estão:
- Florestas em pé já contam como créditos acumulados de carbono, tanto para propriedades privadas, como para governos estaduais, incluindo Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal;
- O proprietário rural pode requerer a posse dos créditos de floresta em pé do governo para projetos próprios, a qualquer momento. Se o proprietário não comunicar a posse dos créditos, eles permanecem sob administração dos governos estaduais;
- Possibilidade de utilizar remoções de carbono em áreas rurais para plantações como papel e celulose;
- A gestão do SBCE será do Ministério da Fazenda e não mais do Ministério do Meio Ambiente, como havia sido proposto no texto inicial.
O projeto agora segue para análise do Senado, onde novos debates e ajustes podem ocorrer antes da sua possível aprovação. O Brasil, ao adotar medidas como o SBCE, busca contribuir para os esforços globais de combate às mudanças climáticas e promover práticas sustentáveis em setores-chave da economia.