Secom CONAFER

Enquanto 500 indígenas de 30 nações originárias entram no segundo mês da Retomada de Cunhambebe Pindorama, território pertencente aos seus ancestrais, em Mangaratiba, no Rio de Janeiro, o STF na capital federal adiou mais uma vez, em “consenso entre os ministros”, o julgamento sobre o chamado marco temporal de terras indígenas. São duas lutas que falam muito da história de opressão contra os povos originários da Terra Brasilis, o território de Pindorama, um mundo originário, de cultura milenar indígena, com milhares de etnias e línguas vivendo sob o equilíbrio da natureza, convivendo em todos biomas sem degradá-los. Mas desde que os europeus invadiram este continente, iniciaram um genocídio de 522 anos que diminuiu a população indígena de quase 10 milhões para menos de 1 milhão. Por isso, estar em Cunhambebe Pindorama, e ao mesmo tempo, vencer um julgamento que põe em risco todas as conquistas de retomadas e demarcações de territórios, retirando dos indígenas direitos assegurados pela Constituição de 88, são ações importantes. Os líderes das nações em Cunhambebe Pindorama seguem dialogando com órgãos públicos, como o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), a Fundação Nacional do Índio (Funai), a prefeitura de Mangaratiba, o Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND), a defensoria pública do Rio de Janeiro e o Batalhão Florestal. Um plano de cogestão da Terra Indígena Cunhambebe Pindorama já foi elaborado e apresentado para uma evolução no processo de retomada, que realiza uma reparação histórica de resgate do mundo original   

O plano de cogestão entre as nações indígenas presentes em Cunhambebe Pindorama, é uma proposta de governança baseada no desenvolvimento socieconômico e cultural das comunidades de agricultores familiares e aldeias indígenas presentes na terra indígena. Foi no litoral sul fluminense que o grande líder tupinambá, Cunhambebe, junto com chefes de seis aldeias diferentes, uniram-se para formar a Confederação dos Tamoios em defesa de seu território. O mesmo território hoje retomado pelos Pataxó, Aimoré, Kadiweu, Kaiapo, Baré, Baniwa, Kariri, Kariri Sapuya, Krenak, Kuikuro, Xavante, Kamakã Mongoio, Kambiwá, Bocum, Bainã, Tupinambá, Munduruku, Arapiuns, Yanomamy, Xukuru, Maytapu, Tupiniquim, Tapuia e outras nações dos povos originários. 

“Crédito da foto: Greice Coelho”

Duas lutas por direitos: retomada de Cunhambebe e o julgamento da Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ, em Santa Catarina

O Supremo Tribunal Federal julga uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, e refere-se à TI Ibirama-Laklãnõ, território onde vivem também os povos Guarani e Kaingang. O status do processo é de repercussão geral, o que significa que a decisão será jurisprudência para todas as instâncias da Justiça sobre procedimentos demarcatórios, podendo anular antecipadamente qualquer tentativa de inclusão do marco temporal. 

O marco temporal é uma interpretação defendida pelos interessados na exploração das TIs que restringe os direitos constitucionais dos povos indígenas. Com ele, os indígenas só teriam direito à terra se estivessem sobre sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Portanto, desconsidera expulsões, remoções forçadas e todas as violências sofridas pelos indígenas antes de 1988 (indígenas não podiam entrar na Justiça de forma independente), além de anular tudo o que foi conquistado e retomado há décadas. 

  “Em setembro de 2021, mais de 6 mil indígenas estiveram em Brasília acampados na Praça dos Três Poderes, unidos contra o marco temporal”

A TI Ibirama-Laklãnõ está localizada entre os municípios de Doutor Pedrinho, Itaiópolis, Vitor Meireles e José Boiteux, 236 km a noroeste de Florianópolis (SC). A área tem um longo histórico de demarcações e disputas, que se arrasta por todo o século XX, no qual foi reduzida drasticamente. O julgamento da ação é de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina. A TI Ibirama-Laklãnõ foi identificada por estudos da Fundação Nacional do Índio (Funai) em 2001, e declarada pelo Ministério da Justiça, como pertencente ao povo Xokleng, em 2003. Os indígenas nunca pararam de reivindicar o direito ao seu território ancestral.

Está escrito na Constituição Federal, em seu artigo 231, que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” Apoiar a garantia dos direitos dos povos originários é um dever da CONAFER, pois todos os indígenas são reconhecidos como agricultores familiares pela Lei da Agricultura Familiar, a Lei nº 11.326, de 2006. 

“Crédito da foto: Greice Coelho”

Em cortes internacionais, os direitos dos povos originários têm obtido legitimidade, como foi o caso dos Xukuru do Ororubá, no agreste de Pernambuco, que tiveram uma vitória histórica, quando o governo brasileiro foi obrigado a depositar na conta da Associação Xukuru, que representa quase 12 mil pessoas de 24 aldeias, uma indenização de US$ 1 milhão. O povo Xukuru conquistou o direito a esse valor por reparações históricas após condenação do governo brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

A luta dos povos originários é também uma luta da CONAFER. Conforme a Lei 11.326 da Agricultura Familiar, que a torna segmento econômico, os indígenas estão inseridos na categoria de agricultores familiares, aliás, os primeiros agricultores deste continente. Estamos juntos, apoiamos e defendemos os povos indígenas em suas aspirações e direitos. E nos aliamos em defesa das suas causas, principalmente o direito à proteção dos seus territórios, à autodemarcação, à liberdade de expressão e preservação da sua rica cultura. 

“Crédito da foto: Greice Coelho”

Para atuar mais diretamente nas causas indígenas, a CONAFER tem secretarias voltadas para as questões dos povos originários, atuando desde o fomento à produção nos territórios com suas diversas culturas agroecológicas, e também no estímulo à cultura e às tradições. A Confederação já emitiu Nota de Apoio ao processo de Retomada do Território Cunhambebe Pindorama.

Leia aqui a íntegra da Nota de Apoio da CONAFER:

“NOTA DE APOIO À RETOMADA DO TERRITÓRIO CUNHAMBEBE PINDORAMA”

“A CONAFER, Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais do Brasil, manifesta integral apoio à Retomada do Território Cunhambebe Pindorama, em Mangaratiba, Rio de Janeiro, reconhecendo o direito de 30 nações indígenas reconquistarem os habitats naturais de seus ancestrais, retirados ao longo de 500 anos a custa de genocídios, invasão de suas terras e tentativa de anulação da cultura milenar dos povos originários.

A CONAFER, entidade fundada em 2011, estrutura-se por meio de Secretarias Nacionais, Coordenações Regionais, Sindicatos e Federações, dando voz e atuando pela autonomia dos agricultores familiares brasileiros, responsáveis por 70% da produção de alimentos que o Brasil consome. Conforme a Lei da Agricultura Familiar nº 11.326, de 2006, que transformou a agricultura familiar em segmento econômico e estabeleceu as categorias agrofamiliares, a Confederação promove o desenvolvimento socioeconômico e cultural de camponeses, extrativistas, quilombolas, posseiros, ribeirinhos, assentados, acampados, pecuaristas, lavouristas, pescadores e indígenas, em todo o território brasileiro. 

Portanto, a CONAFER, como representante de milhares de agricultores familiares indígenas, e também por considerar justa esta causa histórica, afirma categoricamente que apoia a Retomada do Território Cunhambebe Pindorama, pois os seus objetivos contemplam o compromisso permanente com a preservação da sua fauna e flora, o respeito à biodiversidade da região, desenvolvimento econômico e proteção social das aldeias e comunidades indígenas presentes em Cunhambebe, exercendo uma governança indígena baseada na identidade cultural, práticas agroecológicas e gestão territorial sustentável.”

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