Por Juliana Vasconcelos
As chuvas que atingem o Rio Grande do Sul desde o início de maio, e que afetaram ao menos 90% dos municípios gaúchos, além de provocar a morte de centenas de pessoas e deixar o estado em situação de calamidade pública, causam ao mesmo tempo o maior impacto negativo na economia brasileira desde a pandemia. Neste cenário de tragédia e paralisação temporária das atividades do agronegócio e da agricultura familiar em muitas regiões produtivas do RS, busca-se a retomada dos trabalhos o mais rápido possível, o que é importante para não comprometer a economia que estava em viés de alta nas projeções do mercado para o PIB deste ano; para a garantia da segurança alimentar do país e evitar a pressão inflacionária de possível aumento de preços dos produtos agrícolas, como o arroz por exemplo, o governo já anunciou a importação de 1 tonelada do grão
Na quarta posição dentre as economias do Brasil, o Rio Grande do Sul representa 6,5% do PIB nacional, sendo a agropecuária o motor da atividade econômica gaúcha e a principal fonte de renda de 268 municípios, a maioria com menos de 5 mil habitantes. A produção da agricultura e pecuária representa 40% do PIB gaúcho, o impacto do agro na economia do estado é tão grande que 30% da produção industrial é voltada para a área rural, o que mostra que o Rio Grande do Sul é bem mais dependente do setor que o resto do Brasil. A produção agropecuária é responsável por 80% das exportações gaúchas e a principal fonte de recursos que alavanca a balança comercial brasileira.
Mais de 35% dos estabelecimentos agropecuários do Rio Grande do Sul se ocupam da produção pecuária
A agricultura familiar tem muita relevância na economia do estado, com mais de 300 mil produtores agrofamiliares que representam 80,5% dos produtores gaúchos e 25% da área total cultivada. Em 2011, o Rio Grande do Sul chegou a ocupar o primeiro lugar em número de famílias na agricultura, hoje o estado ocupa a quarta posição. A cidade de Canoas, uma das mais afetadas pelas enchentes, tem em média 260 toneladas de alimentos produzidos por mês pela agricultura familiar. Somente na região, aproximadamente mil famílias são beneficiadas pelo Programa de Aquisição de Alimentar – PAA.
No mercado hortifruti, o maior efeito ainda está por vir
Os produtores de frutas do Rio Grande do Sul ainda aguardam os maiores efeitos das chuvas, isso porque as árvores serão afetadas somente no longo prazo. As inundações das plantações podem causar o apodrecimento das raízes, afetando culturas importantes para a economia do estado, como pêssego, maçã e uvas.
No momento, as pessegueiras estão na fase de dormência, por isso os impactos só poderão ser vistos na próxima safra. A colheita das uvas também já havia sido finalizada, o que impediu que os estragos viessem na safra deste ano, porém os parreirais na Serra Gaúcha, principal região produtora de uvas do estado, foram severamente afetados. Estima-se uma perda de mais de 20% na produção de uvas devido a inviabilidade do solo. Haverá impacto também na produção de vinhos do estado. Já para os produtores de maçãs, as perdas podem ser calculadas nesta safra. Até o momento das enchentes 90% da safra havia sido colhida, o desafio agora é a logística.
Impactos na economia nacional
O principal reflexo das chuvas poderá ser visto na inflação deste ano. Com uma meta de 3%, podendo oscilar em até 4,5%, o mercado já elevou as estimativas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal indicador inflacionário, em 0,1 ponto percentual por conta do potencial impacto no preço dos alimentos. Além do impacto na produção de arroz, trigo e carne para o mercado nacional, o estado gaúcho é o quarto produtor de soja, e tem como principal destino o maior parceiro comercial do Brasil, a China. O efeito da tragédia gaúcha reverbera em pelo menos três frentes da economia brasileira: no setor agropecuário, no crescimento do PIB deste ano e na questão fiscal brasileira.
O arroz é presença importante na dieta dos brasileiros e como o Rio Grande do Sul produz 70% do grão no país, o governo já autorizou a compra de 1 milhão de toneladas de arroz no exterior, a fim de evitar pressões inflacionárias e cuidar da segurança alimentar
No PIB, a projeção de crescimento de 2,5% foi reduzida para 2% já nos dias seguintes às chuvas, pois além do efeito no agro, o setor industrial do estado teve 93% da sua atividade atingida. O impacto fiscal é também uma consequência da catástrofe climática. Todos defendem a necessidade de ajuda financeira ao Rio Grande do Sul, mas preocupa o impacto nos cofres públicos, como a suspensão da cobrança da dívida do Estado com a União por três anos, a medida que inclui também o perdão da cobrança de juros sobre a dívida terá um impacto de R$ 12 bilhões nas contas nacionais.
Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/enchente-historica-em-porto-alegre-veja-como-esta-a-cidade-neste-sabado-4/
O sistema financeiro
Segundo o Conselho de Política Monetária do Banco Central, COPOM, ainda é preciso acompanhar os efeitos mais de perto para definir uma estratégia para a Política Monetária. Acredita-se que a primeira medida que o Conselho deverá tomar seja a manutenção da taxa Selic em 10,5% na próxima reunião, em junho, buscando segurar os efeitos do aumento do preço de alimentos como arroz, trigo e carne na inflação de 2024.
Com um cenário externo desafiador, o aumento da inflação americana e a eleição presidencial no país marcada para o mês de novembro, além do impacto das enchentes gaúchas tanto na produção como nas metas fiscais do governo federal, o COPOM pode já na próxima reunião interromper a sequência de quedas da Selic, que vêm ocorrendo gradualmente desde janeiro deste ano.