da Redação
A Federação da CONAFER já está em 40 municípios do Estado que possui 230 mil pequenos produtores; trabalho de base quer reverter a ideia do assistencialismo de décadas, para investir no empreendedorismo dos agricultores associados
Quando olhamos os índices sociais do Piauí, infelizmente nos deparamos com números preocupantes, para sermos comedidos. O seu IDH, ou Índice de Desenvolvimento Humano, tem média de 0,713, sendo o terceiro menor no ranking nacional, superior apenas ao do Maranhão (0,683) e Alagoas (0,677). Isto, além de enfrentar graves problemas socioeconômicos, agravados ainda mais pela pandemia.
Mas a semente do desenvolvimento no segmento da agricultura familiar já foi plantada no Piauí, e está sendo regada diariamente pela FAFER comandada pelo seu presidente e assessor da CONAFER para assuntos do Nordeste. Em entrevista à SECOM, Júlio César, o Júlio Piuaí, como é mais conhecido, falou do antes e do depois da FAFER, das lutas e conquistas, como os Pronafs obtidos junto ao Banco do Nordeste, e que estão mudando a realidade de milhares de pequenos produtores.
SECOM:
Como está organizada a FAFER do Piauí para atingir este objetivo de mudar o paradigma do agricultor com pires na mão e enchada nas costas, sempre em busca de programas sociais, e assim transformar os agricultores familiares em protagonistas do seu segmento econômico, deixando a dependência de programas sociais para empreenderem com capacitação técnica e crédito para a produção?
Júlio César:
A Federação do Piauí foi criada a partir de uma demanda da CONAFER há quase uma década, quando fui enviado ao Estado para trabalhar na organização das bases, no apoio às lutas e causas sociais.
Desde, então, estamos construindo um novo caminho, desde os trabalhos iniciais na reforma agrária, quando criamos 3 acampamentos na cidade de Nazário, e num prazo de 2 anos, construímos 2 assentamentos. Muitos municípios viram a transformação que estávamos promovendo, e buscaram na CONAFER a criação de sindicatos SAFER, como os das cidades de Parnaíba, São Pedro do Piauí, Nazária, José de Freitas e Campo Maior. A partir destes 5 municípios não paramos mais, e hoje temos 40, todos levando conhecimento ao homem do campo, que é o que a gente acredita.
Júlio Cesar, presidente da FAFER do Piauí, na sede da CONAFER, em Brasília, quando concedeu entrevista ao editor de jornalismo da SECOM, Wilson Ribeiro
SECOM:
E como os sindicatos e a Federação levaram inicialmente este conhecimento aos agricultores do Piauí?
Júlio César:
A nossa principal preocupação era quebrar o sistema criado por entidades que nos antecederam, e que há 40 anos sacrificava o agricultor familiar. Então, antes de abrir os sindicatos, atuamos na preparação das nossas bases, demos formação política às lideranças antes das assembleias, e abrimos um canal aos agricultores que queriam ter voz, que buscavam liberdade, assim muitos vieram para somar neste projeto. Agora já temos 5 mil filiados à CONAFER, todos unidos nesta luta diária no campo.
SECOM:
Em que estágio de desenvolvimento se encontra a agricultura familiar do Piauí em relação aos vizinhos do Nordeste e às demais regiões do país?
Júlio César:
Antes os agricultores eram totalmente dependentes do Estado. Estamos mudando este modelo. Então, a ideia é sair do estágio de dependência para um estágio de liberdade para se desenvolver. Antes o agricultor queria a DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) para efeito de aposentadoria. Agora, nossos filiados sabem que a DAP é o passaporte para a obtenção de recursos financeiros, crescimento da produção, geração de lucros e novos investimentos no negócio. Com o fomento dos Pronafs, provamos que os nossos agricultores poderiam fazer parte do PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), o que era negado antes com a desculpa que a gente não tinha produção para a demanda das escolas. Só no ano passado, viabilizamos mais de 1,2 milhão em crédito para 800 processos de Pronaf vitoriosos.
SECOM:
Qual o perfil dos agricultores atendidos pela FAFER-PI? Como a entidade atua na evolução do segmento no Estado?
Júlio César:
Nossos agricultores não tinham conhecimento sobre regularização fundiária e acesso ao crédito. Hoje, eles participam do PNAE, do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos). Nossa meta em 2021 é trabalhar com 10 mil Pronafs no Estado. Antes era impossível porque não havia vontade política para resolver. Por exemplo, nós atuamos em um convênio para ter o CAR (Cadastro Ambiental Rural) que precisa de georreferenciamento junto ao FIP CAR.
(O Projeto Regularização Ambiental de Imóveis Rurais no Cerrado, um dos projetos que compõem o Plano de Investimentos do Brasil, Brazil Investment Plan – BIP, instituído como um instrumento de adesão ao Programa de Investimento Florestal, Forest Investment Program – FIP, administrado pelo Banco Mundial para apoiar países em desenvolvimento. O Projeto é executado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento por meio do Serviço Florestal Brasileiro, SFB)
Júlio César:
Sobre os cultivos agrofamiliares, eles são muito diversos no Piauí. Temos os extrativistas quebradores de coco babaçu que alimentam a produção de óleo e azeite; os aquicultores e piscicultores com projetos como o Sisteminha; os pescadores artesanais do litoral e os ribeirinhos; os agropecuaristas e seus rebanhos leiteiros; os indígenas e os quilombolas. Tudo isso é a diversidade que a CONAFER propõe, e que se consolida na mudança da história que está ocorrendo no Piauí. Quando um quilombola é presidente de um SAFER, por exemplo, é porque algo de significativo foi conquistado por meio do nosso trabalho. Somos incansáveis. E a nossa Confederação comandada pelo presidente Carlos Lopes é responsável por tudo isso.