A cidade baiana de Potiraguá, cujo nome significa lugar de muitas águas, em tupi-guarani, foi manchada pelo sangue dos indígenas Pataxó Hã-hã-hãe, da Terra Indígena Caramuru Catarina Paraguassu, vítimas de uma verdadeira tentativa de chacina, ocorrida neste domingo (21), em uma retomada indígena no sul baiano. O motivo dos crimes é a posse de terras ancestrais em constante disputa. De um lado, os povos originários, de outro, os fazendeiros da região. Com a intenção de retirar os indígenas de uma fazenda retomada no sábado (20), a qualquer custo e à revelia da lei, um grupo autointitulado “invasão zero”, contando com o apoio da própria polícia, assassinou Maria de Fátima Muniz, a Nega Pataxó. Na ação covarde e violenta, o seu irmão, cacique Nailton, e Aritanã Muniz levaram um tiro no abdômen cada um. Vemerson Bonfim foi alvejado na perna. Ideildes Santos teve fratura na clavícula. Osmario Cardoso e Maria Fernandes, depois de espancados, foram encaminhados para o hospital de Itabuna. O restante dos indígenas fugiu pela mata, alguns muito feridos. Esta é uma prova do desprezo pela vida dos indígenas no Brasil. Isto ocorre há 524 anos. Ninguém foi preso pelo assassinato, apenas dois por porte ilegal de arma. Mas foram dezenas de caminhonetes que se reuniram na ponte do Rio Pardo, na entrada da cidade de Pau Brasil, de onde partiram os criminosos para fazer justiça com as próprias mãos. Fotos e vídeos mostram carros queimados e os irmãos Muniz feridos no chão, humilhados pelo grupo miliciano, que comemoravam a violência sobre os dois corpos indígenas agonizando, sem socorro, largados à própria sorte. A União Nacional Indígena (UNI) encaminhou ofício ao Ministério Público Federal, Polícia Federal, Defensoria Pública da União, Ministério Público e Defensoria Pública estaduais, pedindo providências com urgência. A Força Nacional, a ministra dos povos indígenas e uma equipe da FUNAI devem chegar ao local do crime. Infelizmente mais um indígena foi morto com arma de fogo por gente que se considera acima das instituições, como já virou rotina no país com o maior número de homicídios do mundo

A situação permanece tensa na área no entorno e dentro do Território Caramuru, pois segundo relatos, o assassinato afetou profundamente toda a comunidade Pataxó Hã-hã-hãe, aumentando a insegurança de todos com ações de polícia entrando no território indígena sem conhecimento dos caciques. A aprovação inconstitucional do marco temporal pelo Congresso, faz com que alguns grupos de extermínio se sintam autorizados a praticar todo tipo de violência contra os indígenas. A apuração imparcial dos crimes e a demarcação dos territórios são as armas mais importantes para combater este genocídio permanente.

Cacique Nailton caminha ao lado de sua irmã Nega Pataxó, assassinada a tiros neste domingo (21)

A pergunta que se faz é se estes criminosos sentem-se autorizados a assassinar indígenas, e portanto, se eles sabem que não serão punidos. O fato é que as mortes vão se avolumando de tempos em tempos, sempre com um lado perdendo vidas, enquanto o outro segue matando. Não está em questão aqui quem tem razão sobre o fato, mas o fato de que sempre morrem indígenas e quilombolas nestes conflitos. Embora a mídia insista em colocar a situação como se houvesse igualdade de forças. Isso nunca existiu e nunca vai existir. A sociedade moderna já decidiu em favor dos colonizadores desde o momento em que as terras indígenas foram invadidas por europeus.

Mais de 200 ruralistas foram à fazenda Inhuma para atacar a retomada indígena com tiros e fogo

Ano após ano, no dia 20 de janeiro, um dia antes do assassinato de Nega Pataxó, a procissão com a imagem e a bandeira de São Sebastião, com os cantos do reisado e o samba de coro, de casa em casa, acompanhada pelos indígenas no Território Caramuru Catarina Paraguassu. Um dia depois, a fé dos Pataxó Hã-hã-hãe foi mais uma vez testada. Firmes e confiantes em dias melhores, os povos originários seguem sua trajetória de luta e busca por seus direitos. Como colocar na cadeia os responsáveis por esta sequência de crimes, no mínimo, em respeito à Maria de Fátima Muniz.

O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, gravou um vídeo para as redes sociais garantindo que será feita justiça: “nós não aceitaremos qualquer tipo de violência como a ocorrida recentemente no sul da Bahia. Já estamos mobilizados para apurar e punir os responsáveis. Declaro aqui os meus sentimentos à família e a toda a comunidade indígena baiana e do Brasil, assim como o nosso compromisso com as investigações e a justiça.” Para quem está acostumado a ver promessas descumpridas pelos governos e o estado brasileiros em relação aos povos originários, nem existe esperança. 

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