da Redação
Faz 81 anos que ocorreu o 1º Congresso Indigenista Interamericano, em 19 de abril de 1940, no município de Pátzcuaro, no estado de Michoacán, no México; no Brasil, em 1943, o governo Vargas editou o decreto criando o Dia do Índio, e com a mesma data dedicada aos nossos povos indígenas
Existe muita discussão sobre o aspecto pejorativo da palavra índio, associada ao colonialismo europeu e ao genocídio que ocorreu em toda a América. Por isso, a palavra indígena tem sido utilizada como forma moderna de designar os povos autóctones, isto é, nativos, aqueles que viviam em outra geografia antes da sua colonização pelos europeus. Então, indígena é aquele que chegou primeiro, originário, por isso os povos originários.
Neste outro mundo, o mundo originário, viviam nas Américas algo em torno de 60 milhões de indígenas quando Colombo desembarcou em 1492. Alguns historiadores atestam que este número teria chegado a 100 milhões. 500 anos depois, estima-se que mais da metade destas populações indígenas tenham sido dizimadas por febres, bactérias, vírus, doenças e ações de extermínio de milhares de etnias por parte dos colonizadores.
O Brasil é um dos países onde houve maior diminuição da população indígena. Dos 6 milhões que viviam no território atual do Brasil, antes dos portugueses desembarcarem na tarde de 22 de abril de 1500, quando a esquadra de dez naus, três caravelas e cerca de 1,2 mil homens comandada pelo navegador português Pedro Álvares Cabral atingiu o litoral sul da Bahia, na região da atual cidade de Porto Seguro, apenas 900 mil indígenas sobreviveram até os dias de hoje, pela resistência, pela coragem em manter sua busca por autonomia e sabedoria para enfrentar uma sociedade genocida, preconceituosa e injusta que se desenvolveu ao longo de todo este tempo.
Proteger os seus territórios, preservar costumes e tradições, saber dialogar com as instituições do Estado brasileiro, agir para realizar as autodemarcações e buscar o direito à posse dos territórios originalmente ocupados por mais de 3 mil etnias, agora reduzidas a 300, é o desafio das novas gerações.
Nossos primeiros agricultores familiares são os povos originários
Existem evidências da agricultura indígena já existir há 10 mil anos. Hoje, em 2021, produzir em sua própria terra permanece desafiador. Raimunda Matias, 51 anos, a mulher indígena que ilustra esta matéria, é um exemplo da agricultora familiar voltada ao artesanato. O seu nome indígena é Muriã, da etnia Tupinambá. Neta de Moisés Caboco, nasceu, criou-se e constituiu a sua família na aldeia Caramuru, região da Água Vermelha, em Pau Brasil, Sul da Bahia, 300km de Salvador, onde mora atualmente. Raimunda criou filhos e netos trabalhando como agricultora familiar, sempre com muita luta, pois como ela mesmo afirma:
“trabalhei a vida inteira pela minha autonomia, pois já convivemos com os preconceitos e discriminações, e desde pequena aprendi com meu povo e com meus antepassados que a vida não é fácil e temos que todos os dias batalhar pelos nossos sonhos e objetivos, tanto pessoal, como da minha comunidade. Tenho como minha base e força o nosso pai Tupã e nossas forças ancestrais, que me ajudam nesta caminhada, me mantém forte e sempre disposta a estar buscando nosso espaço e direitos. Se cortar nossas raízes, nós brotamos de novo”.
Raimunda Matias é um exemplo de um novo pensamento por autonomia e busca da identidade original que marcou e alimentou as civilizações indígenas estabelecidas há milhares de décadas antes da chegada da civilização europeia. A influência dos povos originários em nossa agricultura é total, desde os indígenas extrativistas, pescadores, ribeirinhos, lavradores, pecuaristas, e os produtores artísticos, os artesãos presentes em todas as aldeias.
É só ver o que mais se produz no Brasil, e teremos a prova da influência da cultura agrícola indígena: a mandioca, o feijão, o milho, o peixe, as frutas, a caça, o extrativismo, o agroflorestamento, a produção de sementes, a medicina, tudo produzido de forma agroecológica, com rotatividade de terrenos, totalmente sustentável, como é definida a produção agrofamiliar em qualquer parte do mundo.
Confederação dos Tamoios, a resistência e a coragem dos indígenas inspiraram a formação de uma nação
Confederação dos Tamoios, a resistência e a coragem dos indígenas inspiraram a formação de uma nação
Quem primeiro defendeu o que chamamos de Brasil hoje foram os povos originários desta terra. Desde o Sul até a Amazônia, passando pelo Cerrado, por todo o litoral brasileiro, nas florestas de Mata Atlântica, em cada centímetro de terra teve o sangue indígena derramado em defesa da sua civilização, das suas tradições e dos seus territórios legitimados pela ancestralidade.
O fato histórico mais marcante nesta luta dos povos indígenas, foi a Confederação dos Tamoios, uma revolta liderada pela nação indígena Tupinambá, que ocupava o litoral do Brasil entre Bertioga e Cabo Frio, envolvendo ainda tribos situadas ao longo do Vale do Paraíba, contra os colonizadores portugueses, entre 1554 e 1567.
Cunhambebe, chefe indígena dos Tupinambás, liderou o movimento que buscava libertar os povos nativos da escravização, além de impedir o avanço dos portugueses. E desde o dia em que o último guerreiro tamoio tombou em terras fluminenses, deu-se apenas o fim de uma batalha, mas não de uma guerra perdida.
Ao defender a nação indígena e lutar contra a escravidão pelo império português, os chefes Aimberê, Pindobuçu, Koakira e Cunhambembe, deixaram um legado de resistência 450 anos depois, e que permanece nas famílias dos povos originários, nas crenças, produzindo o seu próprio sustento, andando com os seus próprios pés, convivendo a absoluta harmonia com o meio ambiente, desfilando os seus cocares e ornamentos, colorindo os seus corpos em danças de guerra ou para celebrar uma nova colheita.
A CONAFER e o seu compromisso com os agricultores indígenas
A Confederação tem 3 secretarias dedicadas diariamente às questões e tradições indígenas, amparados na Lei 11.326 de 2006, que os inclui como agricultores familiares, portanto, fazendo parte do segmento mais importante do campo, pois integram a força econômica que alimenta mais de 70% das famílias brasileiras todos os dias e garante a nossa segurança alimentar.
As secretarias levam os projetos da Confederação até os territórios, fomentam o desenvolvimento socioeconômico nas aldeias por meio de capacitação técnica para aumento da produção agrícola, estímulo ao empreendedorismo rural, e ao mesmo tempo, com parcerias e ações de resgate das culturas ancestrais, atuando estrategicamente dentro das comunidades, mantendo uma política de fortalecimento das etnias, formando uma rede forte e autônoma dos povos originários.
Assim, a CONAFER atende as demandas das comunidades indígenas, desde o cultivo de diversas culturas até o resgate das expressões linguísticas e formas de arte, na releitura de suas histórias e ancestralidades, promovendo a riqueza da sua culinária sustentável e a medicina curadora da floresta.
O presidente da CONAFER, Carlos Lopes, lembra sobre esta data, que “só tem condição de futuro aquele que respeita o seu passado, e a partir do respeito ao que ele é, e ao que somos, é que damos chances de ser alguém no futuro. É com este roteiro de vida que se constrói a diferença, a diferença positiva, da evolução, do resgate dos saberes, do cultivo das tradições, do cuidado com a natureza que os nossos antepassados sempre tiveram, porque todo este conjunto traz progresso, garante a oportunidade a todos de buscar as respostas na sua história. É com o ontem que se faz o amanhã.”
Esta é a melhor homenagem aos povos originários: atuar pelo direito das futuras gerações de crescerem contemplando o nascer e o pôr do sol com total independência, colhendo um tempo de paz e harmonia em seus territórios sagrados.