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MARCO ANCESTRAL: STF suspende decreto sobre licença ambiental que limitava direitos indígenas em MG

Foto: Sérgio Lima/ Poder360

Nesta última sexta-feira, dia 24 de janeiro, o Supremo Tribunal Federal, STF, suspendeu o decreto inconstitucional do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, que definia regras para obrigatoriedade da consulta aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais que habitam áreas afetadas por licenciamentos ambientais e limitava esta consulta apenas aos territórios que atendessem aos requisitos estabelecidos. Lideranças indígenas defendem que este decreto restringia os direitos dos povos tradicionais, uma vez que só era obedecido se os indígenas e quilombolas fossem reconhecidos pela Funai, Fundação Cultural Palmares e Comissão Estadual, e não vivessem em áreas urbanas

O decreto estadual 48.893/2024 definia uma série de regras para que a Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI), medida que assegura que os povos originários sejam consultados sobre projetos de impacto ambiental nos territórios que vivem, fosse feita nos territórios indígenas e quilombolas. A ação do governo de Minas Gerais afetava os direitos indígenas ao restringir a CLPI apenas às terras indígenas demarcadas e homologadas pela União e aos povos tradicionais que não vivem em áreas urbanas. Além disso, a Consulta só era aplicada aos indígenas reconhecidos pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Funai, aos povos tradicionais certificados pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais e às comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares.

Lideranças indígenas defenderam que a ação do governo de Minas Gerais de limitar a CLPI com regras é inconstitucional e restringe os direitos dos povos indígenas quanto a demarcação de terras originárias – Foto: João Edson Alves/Agência Brasil

Em novembro do ano passado, os povos tradicionais estiveram presentes em uma audiência pública para discutir as regras do decreto, argumentando que o texto colocava em risco a autonomia das comunidades diante de possíveis projetos nas áreas onde habitam. Lideranças indígenas se mobilizaram com uma ação contra o decreto e ainda destacaram que as regras estabelecidas têm um entendimento colonial e vão contra a própria jurisprudência do Brasil.

O Supremo Tribunal Federal, que discute a demarcação de terras indígenas diante da inconstitucionalidade do marco temporal, se mostrou mais uma vez favorável aos povos originários ao suspender o Decreto que limitava a Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) apenas aos povos tradicionais dentro de critérios seletivos. A   medida cautelar que suspende o decreto sobre licença ambiental em terras indígenas foi assinada pelo ministro do STF, Flávio Dino, e explica que Minas Gerais não tem competência para tratar do assunto, já que a responsável por tratar temas sobre os povos indígenas do Brasil é a União. 

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino – Foto: Fellipe Sampaio/ SCO/ STF

Este episódio se relaciona a demarcação de terras indígenas e reforça a inconstitucionalidade do marco temporal. Essa tese defende que apenas as terras ocupadas por indígenas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, podem ser demarcadas. Enquanto os povos indígenas esperam o reconhecimento de seus direitos e pelas suas terras originárias, as aldeias seguem em constante ameaça e com vidas em risco, pois a falta de demarcação contribui para a prática de crimes ambientais como desmatamento, garimpo e incêndios.

A demarcação de terras indígenas é muito importante para a preservação do meio ambiente, uma vez que as aldeias funcionam como áreas naturais de conservação, diminuindo os índices de desmatamento e outros crimes ambientais – Foto: Caio Guatelli

A inconstitucionalidade do marco temporal

Em 2023, o STF decidiu derrubar a tese do marco temporal com um placar de 9 a 2 em favor dos povos indígenas. Limitar os direitos dos povos indígenas à data da promulgação da Constituição de 88 é uma agressão aos povos originários e uma ilegalidade constitucional, por isso o STF não aceitou esta tese do marco temporal.

Em dezembro de 2023, o Congresso Nacional aprovou um Projeto de Lei que estabelece o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, contrariando a decisão do STF tomada em setembro do mesmo ano. Nessa decisão, o STF deu ganho de causa ao povo Xokleng, de José Boiteux, em Santa Catarina, em um caso contra o Estado que queria retomar uma área indígena. 

O STF, ao decidir a favor dos Xokleng, o STF reconheceu que as terras pertencem aos povos indígenas por sua história e ancestralidade, sem a necessidade de um marco temporal. Logo, a decisão do STF foi vista como uma derrota para a tese do marco temporal, pois deixou claro que os povos indígenas têm direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam, independentemente da data de ocupação.

Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Apesar disso, o Congresso, ao aprovar o Projeto de Lei em dezembro, desconsiderou essa decisão do STF e tentou instituir o marco temporal por meio da legislação, o que ameaça os direitos territoriais dos povos indígenas. A Lei 14.701, sancionada em outubro de 2023, teve um veto parcial do presidente para se alinhar à decisão do STF, mas isso foi rejeitado pelo Congresso.

Em 22 de abril de 2024, o ministro Gilmar Mendes suspendeu os processos judiciais relacionados ao tema até que o STF tome uma decisão final. Contudo, essa suspensão não se aplica aos processos administrativos de demarcação de terras indígenas. A tensão entre os direitos indígenas e os proprietários de terras ainda é um assunto delicado e muito debatido no país.

Brasília (DF), 30/08/2023, Manifestação de Indígenas contra o marco temporal, na Esplanada dos Ministérios. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

De acordo com o próprio ministro Gilmar Mendes, a principal preocupação não seria a existência de um marco temporal, mas a criação de garantias jurídicas, como a rapidez na solução do processo, a saída dos ocupantes apenas após a indenização e o pagamento de valores compatíveis com o mercado. As discussões começaram em 5 de agosto e estavam previstas para durarem até o dia 18 de dezembro, mas, por decisão do ministro Mendes, a mesa de conciliação foi prorrogada para fevereiro de 2025. 

Apesar do STF ter tomado uma decisão favorável aos povos indígenas de Minas Gerais neste ano, suspendendo um decreto inconstitucional, os prejuízos da inconsistência de uma tese discutida há anos, e que já deveria ter sido encerrada com a definição do STF em 2023, continuam afetando os povos tradicionais do Brasil. Este processo moroso prejudica diretamente os indígenas brasileiros, que clamam por suas terras originárias e de direito, territórios ancestrais ocupados há muito tempo antes de 1500, quando os colonizadores chegaram ao Brasil. Este cenário moldado em incertezas abre margem para crimes ambientais e atos de violência contra os povos originários, causando angústia para as aldeias de todo o país.

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