Por Cleyton Calisto11
O Projeto de Lei 6299/02, também conhecido como “PL do Veneno”, tem como relator o Deputado Federal Luiz Nishimori (PR), mas a proposta inicial é do atual Ministro do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) Blairo Maggi (PP). A proposta defendida desde o final dos anos 90 (PLS 529/1999), prevê modificar a lei vigente (Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989) sobre a regulamentação de agrotóxicos e até mesmo mudar o nome para “defensivos agrícolas”, como uma estratégia de manipular a população a pensar que não são substâncias prejudiciais à saúde.
Ambos, tanto o atual Ministro – defensor há tempos da pauta – quanto o relator são acusados de corrupção ativa, entre outros crimes. Blairo Maggi, também conhecido como “Barão da Soja” e “Rei do desmatamento”, é acusado pela PGR (Procuradoria Geral da República) de estar envolvido em compra de cargos no Tribunal de Contas do estado de Mato Grosso, enquanto era Governador do estado (mais informações). Já o Dep. Fed. Luiz Nishimori teve sua denúncia acatada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), o MPF (Ministério Público Federal) o acusou de empregar 9 “funcionários fantasmas” em seu gabinete durante seu mandato como Deputado Estadual na Assembleia Legislativa do Paraná, gerando um desvio de aproximadamente R$ 2,8 milhões em dinheiro público (mais informações).
“Nosso projeto quer colaborar com comida mais sadia e segura para nossa sociedade. Ninguém vai colocar novas substâncias, novos produtos no mercado. A Anvisa é muito competente, muito rígida e vai ter as mesmas funções de hoje”, tenta justificar o Deputado Federal e apresenta como objetivo do PL modernizar a legislação para reduzir o tempo de avaliação dos agrotóxicos e agilizar o processo de regulamentação. Mas sabemos que não é isso.
Em defesa Nishimori aponta não querer colocar veneno na comida da população, mesmo defendendo a PL do Veneno, que inclusive chama de PL da “Lei do Alimento mais Seguro”, visando desorientar a população. Apresenta os “defensivos agrícolas” como “remédio para as plantas” e não como substâncias químicas perigosas. Alías, chamar os agrotóxicos de “defensivos agrícolas” é proposto pelo PL 3200/15 (um dos apensos do PL 6299/02), de acordo com o relator o termo “agrotóxico” é pejorativo e não deve ser utilizado. Tudo é uma questão semântica, ao propor a troca de nome eles acreditam que a população terá opinião favorável sobre ser envenenada diariamente.
Com a flexibilização do nome também vem a flexibilização da lei, para a lei vigente não há uma preocupação com “riscos”, mas sim com o perigo dos supostos “defensivos”. Substâncias com características teratogênicas (prejudiciais ao feto durante a gravidez), carcinogênicas (causadoras de câncer) ou mutagênicas (capazes de gerar mutações genéticas), assim como provocadoras de distúrbios hormonais e danosas ao sistema reprodutivo são consideradas substâncias perigosas e por isso rejeitadas, mas na nova proposta elas podem se encaixar em “riscos aceitáveis” e serem aprovadas.
Retira também a responsabilidade criminal sobre: a má aplicação; o local; e a quantidade de agrotóxicos, definindo como crime somente a importação, a produção, o transporte e o armazenamento de produtos “não registrados ou autorizados”. E cria taxas de registro com valores variando entre mil e cem mil reais, a chamada Taxa de Avaliação de Registro visa financiar a manutenção da lei caso seja aprovada, os valores arrecadados serão direcionados ao Fundo Federal Agropecuário sob a responsabilidade do MAPA.
A forma de aprovação de um agrotóxico também é alvo de mudança, atualmente é necessária a aprovação de três órgãos: Anvisa, MAPA e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). O processo como um todo pode levar de 3 à 8 anos, demora justificada pela falta de investimentos e na precarização imposta aos órgãos pelos cortes de verbas governamentais.
O PL busca alterar a lei, centralizando o poder na mão do MAPA, dando somente 120 dias de prazo para a manifestação dos outros dois órgãos e ao mesmo tempo permite o MAPA não acatar a essas manifestações. Acrescenta também a necessidade desses órgãos apresentarem um relatório de análise de risco (diferente de uma análise de perigo). Após o prazo o ministério da agricultura pode emitir um registro provisório baseado na análise de riscos (e não de perigo) da própria empresa responsável pelo comércio do agrotóxico, tendo como requisito a substância ser utilizada em no mínimo mais 3 países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Apesar de parecer uma grande barreira ela não é tão relevante, afinal países como Argentina e México possuem leis ainda mais flexíveis em relação ao uso de agrotóxicos.
A agricultura brasileira consome fórmulas proibidas em diversos países da OCDE e o Brasil desde 2008 é líder mundial no uso de venenos agrícolas, ao ponto de brasileiros ingerirem aproximadamente 5 litros de agrotóxicos por ano durante as refeições (dados do INCA – Instituto Nacional do Câncer) e para cada trabalhador rural morto em conflito agrário morrem cinco por agrotóxicos, afirma a Comissão Pastoral da Terra. Apesar de ser chamada pelo relator de a “Lei do Alimento mais Seguro” a Anvisa discorda e apresenta a possibilidade de a PL prejudicar ainda mais o trabalho rural, pois não há no projeto considerações ligadas diretamente aos efeitos de agrotóxicos sobre o meio ambiente ou a saúde e o MPF inclusive afirma ser inconstitucional a proposta em diversos pontos.
O governo Temer se apresenta cada vez mais despreocupado com a população, flexibilizando a utilização de agrotóxicos, indo na direção oposta dos debates sobre saúde e meio ambiente a nível mundial. Pretende continuar o bombardeio químico aos nossos alimentos e solos ao invés de reduzi-lo e não podemos nos esquecer, como aponta a engenheira agrônoma de 97 anos ganhadora do One World Award (principal título de agricultura orgânica mundial) Ana Maria Primavesi:
“O segredo da vida é o solo, porque do solo dependem as plantas, a água, o clima e nossa vida. Tudo está interligado. Não existe ser humano sadio se o solo não for sadio e as plantas, nutridas”
Em alternativa ao pacote do veneno existe o PL 6670/2016, construído entre a sociedade civil organizada e o governo, propõem a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos. O site Chega de Agrotóxicos apresenta melhor o tema e disponibiliza uma petição contra o PL do Veneno e pela aprovação do PL 6670/2016. O abaixo-assinado já conta com mais de um milhão de assinaturas. O PL 6670/2016 também está sobre consulta pública no site da câmara.
Fontes
‘Veneno na mesa’ ou modernidade? Tire dúvidas sobre impacto na saúde de novo projeto de lei sobre agrotóxicos
O que você precisa saber sobre a ‘PL do Veneno’ e como ela afeta sua alimentação
Comissão da Câmara aprova ‘PL do Veneno’, projeto que flexibiliza uso de agrotóxico
Suspensa sessão que debate projeto que altera lei do agrotóxico
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4 coisas que você precisa saber sobre o PL do Veneno
PL que flexibiliza registro de agrotóxicos afetará saúde e meio ambiente, afirma MPF
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A Confederação da Agricultura Familiar