Por João Barros

A agricultura familiar no Brasil não é apenas estratégica para a segurança alimentar de 212 milhões de brasileiros, mas também para uma produção de alimentos sustentável. Porém, uma grande parte dos pequenos produtores frequentemente enfrentam desafios que dificultam o acesso a mercados, crédito e assistência técnica. Para ajudar a vencer estes desafios dos agrofamiliares e promover o desenvolvimento com sustentabilidade, o Estado implementa uma série de políticas públicas, como os atuais Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) 

O Pronaf, criado pelo Decreto Nº 1.946 em 1996, tem como principal objetivo promover o desenvolvimento sustentável da agricultura familiar. Ao facilitar o acesso ao crédito rural, o Pronaf impulsiona a produtividade das pequenas unidades agrícolas e contribui para a melhoria das condições de vida no campo. Nos primeiros 20 anos de sua implementação, cerca de 50% dos recursos foram destinados a grandes operações de crédito voltadas para a agricultura de maior porte, especialmente nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, favorecendo a produção de commodities agrícolas.

Essa trajetória do Pronaf revela que por muito tempo houve uma concentração de investimentos em segmentos mais capitalizados da agricultura familiar, o que reorientou o Pronaf para ações mais inclusivas para os pequenos agricultores, justamente a parcela que mantém práticas agrícolas mais tradicionais. Embora continue sendo um marco fundamental, a evolução do programa deve incluir mecanismos para assegurar que pequenos produtores de regiões menos favorecidas, como o Norte e o Nordeste, também tenham pleno acesso a seus benefícios. Recentemente, iniciativas têm buscado ampliar esse alcance, promovendo maior diversificação de culturas e a inclusão de tecnologias sustentáveis.

PAA e PNAE

Enquanto o Pronaf se concentra no fomento à produção, o PAA e o PNAE desempenham papéis essenciais na comercialização e na inclusão socioeconômica dos agricultores familiares. O PAA possibilita a compra direta de alimentos produzidos por esses agricultores para suprir demandas institucionais, como escolas e unidades de saúde, enquanto o PNAE assegura que, no mínimo, 30% dos alimentos adquiridos pelas escolas públicas sejam provenientes da agricultura familiar.

Esses programas não apenas melhoram a qualidade de vida dos pequenos agricultores, mas também têm um impacto direto na segurança alimentar e nutricional da população, principalmente em áreas vulneráveis. Eles promovem a valorização de culturas alimentares locais, fortalecem economias regionais e contribuem para o desenvolvimento sustentável. No entanto, a execução desses programas enfrenta desafios, como limitações de infraestrutura em regiões mais remotas e dificuldades na organização de associações e cooperativas.

Nos últimos anos, a pandemia de Covid-19 testou a resiliência desses programas. A interrupção das cadeias de comercialização e o fechamento das escolas afetaram diretamente a demanda por alimentos da agricultura familiar. O PAA e o PNAE precisaram se adaptar, e algumas gestões inovaram, distribuindo cestas de alimentos para famílias vulneráveis. No entanto, isso também expôs a necessidade de maior flexibilidade e planejamento para lidar com crises futuras.

Embora as políticas públicas voltadas à agricultura familiar tenham gerado avanços significativos, as pesquisas revelam discrepâncias regionais na execução do PNAE. Dados de 2019 mostram que 34% das entidades executoras compraram menos de 30% dos alimentos da agricultura familiar, descumprindo a Lei Nº 11.947/2009. Esse dado reflete a complexidade da implementação, que vai além de questões técnicas e envolve a organização dos agricultores, além da oferta adequada de serviços de assistência técnica e extensão rural (ATER).

Por outro lado, exemplos de boas práticas regionais mostram que é possível superar esses desafios. Municípios que conseguiram organizar cooperativas e fortalecer a assistência técnica apresentam resultados melhores, garantindo que os agricultores familiares tenham acesso ao mercado institucional. O fortalecimento das políticas depende, portanto, de uma articulação mais eficaz entre os agricultores, cooperativas e instituições públicas. Conselhos como o Conselho de Alimentação Escolar (CAE) têm um papel fundamental para assegurar o cumprimento dos requisitos legais e melhorar a execução local dos programas.

Um caminho para o futuro

A análise dos programas Pronaf, PAA e PNAE deixa claro que estas políticas públicas são fundamentais para a transformação social e econômica das famílias agricultoras. Elas oferecem um caminho para a inclusão produtiva, a sustentabilidade e a emancipação dos trabalhadores rurais, além de contribuírem para a segurança alimentar e a melhoria da qualidade de vida no campo.

No entanto, o impacto dessas políticas só pode ser ampliado por meio de um esforço conjunto entre governos, agricultores e sociedade civil. A promoção de circuitos curtos de comercialização, como feiras locais e parcerias com restaurantes e mercados regionais, é uma das alternativas para fortalecer a agricultura familiar. Além disso, é fundamental garantir que os agricultores mais vulneráveis também tenham acesso aos benefícios dessas políticas, com atenção especial à diversidade regional do Brasil, onde as realidades da agricultura familiar variam drasticamente entre o Norte, Nordeste, Sul e Sudeste.

Considerações Finais

A ciência, em particular a pesquisa em Administração, tem contribuído para a construção de soluções que respondam às necessidades reais dos agricultores, promovendo um futuro mais justo e sustentável para o setor. Estas políticas públicas representam um passo importante na construção de um país mais inclusivo, no qual a agricultura familiar desempenha um papel central na promoção da segurança alimentar e do desenvolvimento sustentável. O desafio agora é ampliar o alcance dessas ações, garantindo que mais agricultores possam se beneficiar das oportunidades geradas, e que as políticas avancem na direção de uma verdadeira transformação social.

Com informações de:

DA SILVA, Francisco Dreno Viana; DE SOUSA, Washington José. A pesquisa em agricultura familiar na ciência administrativa no Brasil: uma revisão de literatura. CONTRIBUCIONES A LAS CIENCIAS SOCIALES, v. 17, n. 4, p. e5926-e5926, 2024.

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