Foto: Marizilda Cruppe/Amazônia Real
Neste mês, os resultados de uma pesquisa sobre os impactos do mercúrio nas comunidades amazônicas da Fiocruz foram divulgados em uma reunião do Conselho Nacional de Saúde, CNS. Os dados mostram que a relação dos povos indígenas com a terra está cada vez mais ameaçada pela exploração econômica descontrolada. O mercado trata as florestas como itens comerciais, invade territórios indígenas e ignora o valor originário da sustentabilidade, acelerando a destruição do meio ambiente. Além de degradar a natureza, a mineração ilegal tem causado uma grave crise de saúde, especialmente na Terra Yanomami, com o despejo de mercúrio nos rios. Esse metal se torna muito tóxico quando espalhado por humanos, contaminando a água, o solo e prejudicando a saúde dos indígenas e ribeirinhos, pois causa doenças no cérebro e nos nervos, como perda de memória, tremores e dificuldades para falar e se movimentar. O mercúrio também afeta os rins, o coração e o sistema imunológico, prejudicando o desenvolvimento de crianças
Os territórios são muito fundamentais para os povos indígenas, pois garantem sua sobrevivência, cultura e modo de vida. É na natureza que os povos originários cultivam alimentos, caçam, pescam e mantêm tradições. Além disso, as aldeias funcionam como reservas ambientais naturais do país, ajudando na preservação de conhecimentos ancestrais sobre a natureza e a sustentabilidade. Por esses motivos, crimes ambientais como desmatamento, garimpo ilegal e grilagem de terras são ameaças à vida dos indígenas. Muitas vezes, a saúde dos povos tradicionais é colocada em risco por conta da fumaça das queimadas e pela contaminação dos rios com mercúrio, por exemplo.
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Povos indígenas e ribeirinhos são os mais afetados pela contaminação de mercúrio, pois dependem dos rios para beber água e se alimentam da pesca – Foto: Reprodução
Os dados mostram que, na Terra Indígena Caiapó, mais de 5.000 hectares foram destruídos pelo garimpo ilegal, para efeito de comparação, esse número equivale a 5.000 campos de futebol. Na Terra Munduruku, esse número chega a 15.000 hectares, e na Yanomami, a cerca de 500. Além de prejudicar o meio ambiente, a mineração ilegal tem causado uma grande crise de saúde, especialmente na Terra Yanomami. Um estudo da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica encontrou mais de 4.000 pontos de garimpo ilegal na Amazônia, liberando cerca de 150 toneladas de mercúrio nos rios da região todos os anos.
De acordo com o pesquisador da Fiocruz, Paulo Basta, o excesso de mercúrio despejado no rio não se mistura com a água, pois sua densidade é 13 vezes maior. Em vez disso, o mercúrio fica no fundo do leito, onde bactérias o transformam em metilmercúrio, uma forma orgânica que entra na cadeia alimentar, contaminando peixes, algas, crustáceos e outros animais aquáticos. Quando os indígenas comem esses peixes, acabam ingerindo o mercúrio, tornando o pescado o principal meio de contaminação.
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Aldeia Yanomami sofre com contaminação de mercúrio na região do rio Mucajaí – Foto: Daniel de Oliveira d’El Rei Pinto/Fiocruz
Durante a pesquisa, três aldeias indicadas pela Associação Indígena Pariri foram visitadas. No total, 200 indígenas foram avaliados em 35 casas entre outubro e novembro de 2019. O trabalho resultou em um relatório técnico entregue às lideranças em 2020. A pesquisa mostrou que muitos indígenas estavam com altos níveis de mercúrio no corpo, sendo que 6 em cada 10 apresentaram níveis elevados, e esse número aumentou para 9 em cada 10 perto dos garimpos. Também foi identificado que esses altos níveis de mercúrio estavam relacionados a problemas no sistema nervoso, como nervosismo e irritação, além de afetar gravemente mulheres em idade fértil e crianças pequenas. Todos os 88 peixes analisados estavam contaminados, principalmente os carnívoros do topo da cadeia alimentar.
Como resposta a essa situação, começou a notificação dos casos de intoxicação por mercúrio, algo que nunca tinha sido feito antes. Isso ajudou a mudar os discursos a favor do garimpo. Com as notificações, foram registrados 546 casos de intoxicação por mercúrio, sendo 270 em Roraima, entre 2007 e hoje. Agora, é importante aumentar essas notificações e garantir que as autoridades de saúde e meio ambiente tratem o problema com urgência para diminuir os prejuízos do mercúrio nas aldeias.
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Foto: 363ª RO
Quando as mães indígenas são expostas ao mercúrio, seja pela ingestão de água ou peixes contaminados, o metal pode atravessar a placenta e afetar o bebê em formação. Isso pode levar a malformações congênitas, como defeitos no cérebro, no coração e em outros órgãos. O mercúrio também pode causar o Mal de Minamata, uma doença neurológica grave que afeta o sistema nervoso central, provocando tremores, dificuldades motoras, perda de memória e outros problemas. As crianças expostas ao mercúrio podem sofrer atrasos no desenvolvimento, dificuldades de aprendizagem e até perda de habilidades motoras, o que compromete a qualidade de vida.
Com tantas violações, o quadro de doenças nas aldeias é muito prejudicado com os desafios enfrentados pelos povos indígenas em meio a uma crise climática, como a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, por exemplo. A seca dos rios dificulta o transporte de barco, que é a principal forma dos povos originários isolados irem até hospitais e postos de saúde. Além disso, problemas no transporte aéreo, como chuvas fortes ou falta de estrutura, tornam ainda mais difícil chegar a esses lugares. Isso acaba piorando a saúde dos indígenas, pois eles não têm acesso aos cuidados médicos, deixando as comunidades mais vulneráveis.
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Sabendo desses desafios para os povos indígenas acessarem serviços de saúde de qualidade, a CONAFER, por meio da Secretaria Nacional de Povos, Comunidades Tradicionais e Política Social, a SEPOCS, atende as aldeias de todo o país, fazendo o cadastro dos indígenas no programa mais completo de benefícios em saúde, o Mais Vida Brasil, que oferece atendimento por telemedicina, reembolso de medicamentos, assistência odontológica, seguro de vida, auxílio funeral e orientação farmacêutica por telefone. Este programa facilita o acesso dos povos originários a serviços de saúde de qualidade.
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O Mais Vida Brasil faz a entrega de kits de higiene bucal em aldeias indígenas
Com o objetivo de ajudar na proteção das florestas e das aldeias indígenas, a Secretaria de Políticas de Monitoramento e Segurança no Campo da CONAFER forma guardiões ambientais, que atuam como brigadistas e vigilantes territoriais, combatendo os incêndios e monitorando áreas nas terras indígenas de todo o país. Esta iniciativa protege o meio ambiente e a saúde dos povos originários junto a outros projetos da CONAFER, como a plataforma Hãmugãy, que facilita registros ágeis de ocorrências ambientais, como desmatamento, incêndios e garimpo ilegal, por meio de fotos e coordenadas GPS.
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Em 2024, o programa de Formação nos Territórios da CONAFER capacitou mais de 300 guardiões ambientais nas aldeias indígenas
A CONAFER atende, no total, mais de 114 mil famílias indígenas em todas as regiões do país. Este trabalho é realizado pela SEPOCS, que leva até as aldeias ações sociais, como doações de brinquedos, comida, água e roupas. Além disso, a Confederação fortalece a luta indígena, como o direito às terras originárias, por meio de ações educativas, que ensinam sobre as leis, e com o posicionamento da própria entidade em reportagens, publicadas no site da Confederação e no canal do YouTube TV CONAFER, contra a inconstitucionalidade do marco temporal.