O Ministério do Trabalho e Previdência Social publicou nesta quarta-feira (23) a portaria 1.525 que disciplina o pagamento do seguro-desemprego do pescador artesanal que estava suspenso. A portaria traz uma lista com 398.054 pescadores de todo o país. Destes, 72 mil são do Amazonas, num total de R$ 350 milhões aos pescadores amazonenses. “Essa portaria, que anunciamos hoje, foi fruto de um acordo com a sociedade civil. Nesse sentido, participaram do acordo as colônias, federações e confederação dos pescadores, parlamentares, Ministério Público, Defensoria da União, Ministério do Trabalho, INSS e AGU”, afirmou o presidente do INSS, Guilherme Serrano, informando que nos próximos dias nova portaria será divulgada, trazendo os detalhes do pagamento do seguro-desemprego do pescador artesanal. O pagamento será feito por meio de Requisição de Pequeno Valor (RPV) emitida pelo Poder Judiciário
No último dia 27 de outubro, o Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) já havia informado que o Seguro-Desemprego Pescador Artesanal 2015/2016, que beneficia praticamente 400 mil pescadores, seria pago em até quatro parcelas aos trabalhadores por meio de Requisição de Pequeno Valor emitida pelo Poder Judiciário, após acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a Advocacia Geral da União (AGU) e a Confederação Nacional dos Pescadores e Aquicultores (CNPA).
Os segurados serão identificados pelo INSS e poderão receber até 4 parcelas de R$ 1.212, isso de acordo com cada situação. Os valores correspondem à totalidade da obrigação na data da homologação do Acordo, estando afastadas a incidência de correção monetária e juros moratórios. O pagamento do benefício Seguro Defeso 2015/2016 foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por meio da declaração de inconstitucionalidade da Portaria Interministerial n.º 192, de 5 de outubro de 2015, na Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI n.º 5.447 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF n.º 389, devido alguns processos judiciais e coletivos solicitando o pagamento do direito, que vem se arrastando na justiça há anos. Ao todo são quase 50 ações coletivas e mais de 80 mil ações individuais.
Para ter direito às parcelas, o pescador precisa declarar que não dispôs de outra fonte de renda durante o ciclo 2015/2016; não recebeu integralmente os valores referentes ao seguro-desemprego do pescador artesanal nas esferas administrativa e/ou judicial; possuía, na época, inscrição no Registro Geral de Pesca (RGP) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; que se dedicou à pesca das espécies e nas localidades atingidas pelo defeso ininterruptamente durante o período compreendido entre o término do defeso anterior e o início do defeso em curso ou nos doze meses imediatamente anteriores ao início do defeso em curso; e que renuncia a todos os direitos remanescentes sobre as parcelas do seguro defeso 2015/2016.
Não têm direito ao Seguro-Defeso:
- os trabalhadores titulares de ação individual com idêntica situação jurídica que tenha sido julgada improcedente por decisão judicial com trânsito em julgado ou que tenha tido a condição de pescador artesanal afastada por questões fáticas em segundo grau de jurisdição (na ação individual);
- aqueles que já tenham recebido – judicial ou administrativamente – os valores reconhecidos pelo Acordo;
- tenham afastada, em procedimento administrativo, a condição de segurado pescador artesanal, de que trata o artigo 11, inciso VII, alínea “b”, da Lei nº 8.213/91 ou, ainda, o próprio direito ao benefício no período tratado em razão de não preenchimentos dos demais requisitos legais;
- aqueles que não tenham satisfeito as exigências solicitadas pelo INSS quando do processamento (listas do ANEXO II e ANEXO IV);
- os pescadores que não tenham apresentado os respectivos TERMOS INDIVIDUAIS de adesão ao Acordo; e
- aqueles que não tenham preenchido os demais requisitos legais (Lei n.º 10.779/03 e Decreto n.º 8.424/15).
Portaria beneficia comunidades tradicionais do Xingu
Em agosto deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) havia solicitado à Justiça o pagamento do seguro-defeso retroativo a R$ 5 milhões em danos aos pescadores do Xingu (PA). O pedido fazia referência aos anos de 2015 e 2016, quando uma portaria do governo federal determinou que pescadores de todo o país não receberiam os pagamentos do seguro-defeso, benefício que assegura a sobrevivência destes profissionais durante os períodos de piracema dos peixes, em que a legislação ambiental proíbe a atividade da pesca. A suspensão provocou dificuldades de sustento para milhares de famílias e foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que ordenou o pagamento retroativo dos períodos em que o seguro foi suspenso. Até hoje, os pescadores da bacia do rio Xingu, no Pará, não receberam o pagamento.
Com base nesses fatos, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação civil pública para obrigar o governo federal a pagar os retroativos que deve aos pescadores do Xingu, acrescidos de indenizações por danos individuais – de R$ 10 mil para cada pescador, e por danos morais coletivos, de R$ 5 milhões, que devem beneficiar toda a coletividade dos pescadores nos municípios de Altamira, Anapu, Brasil Novo, Medicilândia, Porto de Moz, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu.
A portaria que suspendeu os períodos de defeso e, consequentemente, o pagamento do seguro-defeso foi a de número 192/2015 e baseou-se em uma nota técnica do Ministério do Meio Ambiente que, de acordo com o entendimento de especialistas, desconsiderou a preservação da vida marinha, lacustre e fluvial, bem como a subsistência dos pescadores artesanais. Diante das inconsistências, o Senado aprovou um decreto sustando os efeitos do ato.
O governo federal na época respondeu com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), levando a discussão para o STF. Em março de 2016, o ministro Luís Roberto Barroso restabeleceu o pagamento do seguro, mas só após decisão final do plenário do Supremo, em 2020, é que foi determinado o pagamento do retroativo, referente ao período de outubro de 2015 a novembro de 2016.
O MPF em Altamira questionou o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) sobre o cumprimento da decisão do STF e os pagamentos aos pescadores da região do médio Xingu. O Instituto reconheceu que os pagamentos são devidos e deveriam ser pagos imediatamente, mas até o presente momento, os pescadores não receberam os retroativos. Diante do impasse, o MPF recorre agora à Justiça Federal.
Para o MPF, além dos valores do seguro, os pescadores da região também devem receber pelos danos individuais, já que tiveram o sustento de suas famílias prejudicado pela decisão do governo federal. Ainda que se alegue que a pesca estava permitida pelo mesmo ato governamental, o MPF lembra que a portaria foi emitida poucos dias antes do início do período do defeso, sem informação direta aos pescadores.
“Para além do desconhecimento do ato interministerial por parte dos pescadores, afinal, a região da bacia do Xingu conta com comunidades distantes dos grandes centros urbanos – locais estes que sequer funciona sinal de telefonia móvel –, o tempo foi extremamente curto para qualquer planejamento visando nova temporada de pesca”, argumenta a ação judicial. A pesca também foi inviabilizada, explica o MPF, pelo temor da fiscalização dos órgãos ambientais que provoca consequências administrativas e criminais aos pescadores.
Mesmo que pescassem, acrescenta o MPF, o sustento de suas famílias estaria ameaçado, porque na época da reprodução das espécies o pescado não tem tanto valor comercial, seja pela alteração da massa magra ou pela presença de ovas no interior dos peixes. Por esses motivos, e porque os pescadores artesanais compõem um grupo socialmente vulnerável, o MPF pediu que a União indenizasse individualmente todos com o valor de R$ 10 mil.
Com informações do Ministério da Agricultura e Pecuária, do Ministério do Trabalho e Previdência Social e Ministério Público Federal.